Vacina de Oxford contra covid é aprovada no Reino Unido; Brasil segue sem data certa
A vacina contra o coronavírus desenvolvida por cientistas da Universidade de Oxford foi aprovada para uso no Reino Unido. Isso levará a uma expansão massiva da campanha de imunização do Reino Unido.
A vacina de Oxford é também uma das principais apostas do governo brasileiro para combater o coronavírus. O Brasil foi um dos países que participou da fase de testes do imunizante da universidade britânica e possui um protocolo de transferência de tecnologia que permite aos brasileiros produzir nacionalmente a vacina da Oxford.
O secretário britânico da Saúde, Matt Hancock, disse que a vacina começará a ser aplicada na população em 4 de janeiro e que o ritmo da imunização será acelerado nas primeiras semanas.
O Reino Unido encomendou 100 milhões de doses da vacina de Oxford junto à fabricante AstraZeneca — o suficiente para vacinar 50 milhões de pessoas. Esse número de doses, combinado com o que o Reino Unido já comprou da Pfizer, garantirá a imunização de toda a população, segundo o governo.
A aprovação, pelo órgão regulador dos medicamentos, significa que a vacina é considerada oficialmente segura e eficaz.
Grupos prioritários da população britânica já vêm recebendo a vacina da Pfizer-Biotech. Mas essa vacina da Oxford-AstraZeneca levará a um aumento significativo na vacinação, pois é barata e fácil de produzir em massa.
Crucialmente, ela pode ser armazenada em uma geladeira normal — ao contrário do produto da Pfizer-BioNTech, que precisa de armazenamento a -70 ° C — então será muito mais fácil alcançar lares de idosos e clínicas de saúde.
A aprovação da nova vacina acontece em um momento de escalada desenfreada da pandemia no Reino Unido, com números de casos superando a primeira onda no país. Autoridades de saúde alertam para a possibilidade de esgotamento de leitos em hospitais. O Reino Unido vem ampliando restrições e lockdowns neste fim de ano na tentativa de conter a pandemia. Na terça-feira (29/12), foram confirmados 53.135 novos casos e 414 mortes no Reino Unido.
O primeiro-ministro, Boris Johnson, disse que o anúncio da aprovação da vacina de Oxford é “um triunfo” para a ciência britânica, acrescentando: “Agora iremos vacinar o máximo de pessoas o mais rápido possível”.
A maior autoridade de saúde do país, Chris Whitty, elogiou o “considerável esforço coletivo que nos trouxe até este ponto”. Hancock disse que o desenvolvimento foi um “momento significativo” na luta contra o vírus.
E no Brasil?
A vacina da Oxford-AstraZeneca é uma das principais apostas do Brasil no combate ao coronavírus.
A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) tem um acordo com a farmacêutica para a compra de 100,4 milhões de doses. Além disso, devido a um acordo de transferência tecnológica, a Fiocruz afirma que poderia produzir a vacina, fornecendo até 210,4 milhões de doses para o SUS em 2021.

Vacina de Oxford vai ser produzida no Brasil em 2021 – REUTERS
A presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, disse que a fundação pretende entregar 1 milhão de doses de sua vacina entre os dias 8 e 12 de fevereiro. Depois disso, a produção seria escalonada e a partir do dia 22 de fevereiro a Fiocruz estaria produzindo 700 mil doses diárias.
Apesar da posição privilegiada para produção do produto, o Brasil não tem data para começar a vacinação da população.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ainda não aprovou imunizante algum.
Na terça-feira (29/12), o secretário executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, especulou sobre quando o Brasil pode começar a vacinar.
“Na melhor das hipóteses, nós estaríamos começando a vacinação no dia 20 de janeiro. Em um prazo médio, entre 20 de janeiro e 10 de fevereiro. E no prazo mais longo, a partir de 10 de fevereiro”, disse Franco. “Isso vai depender de uma série de fatores, inclusive logística, e vai depender de os laboratórios estarem em dia no seu processo de submissão contínua e com o processo de registro na Anvisa.”
Nos últimos dias, houve troca de farpas entre o governo brasileiro e a fabricante Pfizer, cuja vacina já vem sendo usada em diversos países.
O presidente Jair Bolsonaro disse que os laboratórios não estavam interessados em vender vacinas para o Brasil.
“O Brasil tem 210 milhões de habitantes, então, um mercado consumidor de qualquer coisa enorme. Os laboratórios não tinham que estar interessados em vender para a gente? Por que eles não apresentam documentos para a Anvisa? Pessoal diz que eu tenho que ir atrás. Não, não. Quem quer vender… se eu sou vendedor, eu quero apresentar.”
A Pfizer respondeu, em nota, que o processo brasileiro para aprovação da vacina na Anvisa exige mais tempo, por conta de pedidos específicos da agência reguladora brasileira.
O Brasil aprovou recentemente um regime de uso emergencial de vacinas, mas a Pfizer disse que o processo mais célere para aprovar o imunizante é através do registro normal da vacina — sem uso desse protocolo emergencial, que impõe mais condições.
Na terça-feira, após a crítica da Pfizer, a Anvisa modificou algumas das exigências. Antes, a agência exigia que a fabricante fornecesse o número exato de doses que seriam disponibilizados, algo que a Pfizer afirma não ser possível fazer antes que um contrato de compra seja firmado. Agora, a Anvisa trocou essa exigência por uma “estimativa” da fabricante.
O Brasil enfrenta também problemas logísticos para vacinação. O jornal Estado de S. Paulo noticiou que em um leilão na terça-feira (29/12) para a compra de 331 milhões de seringas que serão usadas na vacinação fracassou — com o governo federal conseguindo comprar apenas 7% do estoque necessário. O problema teria sido o alto preço cobrado pelas fabricantes que ofereceram seringas no leilão.
As vacinas também têm sido alvos de disputas políticas — em especial entre Jair Bolsonaro e o governador de São Paulo, João Doria, ambos potenciais candidatos na eleição presidencial de 2022. Doria vem fazendo campanha pela aprovação da vacina CoronaVac, desenvolvida pela empresa chinesa Sinovac e pelo Instituto Butantan, ligado ao governo de São Paulo.
Já Bolsonaro chegou a declarar que o governo brasileiro não compraria “vacina chinesa”, tendo mostrado preferência pelo imunizante da Oxford-AstraZeneca.
O Brasil teve 1.111 mortos e 58,7 mil novos casos de coronavírus registrados nas últimas 24 horas.
Enquanto isso, diversos países — incluindo os latino-americanos Argentina, Chile, México e Costa Rica — já começaram a imunizar sua população contra a covid-19.
No Reino Unido, mais de 600 mil pessoas já receberam a primeira dose da vacina da Pfizer, e alguns idosos já começaram a receber a segunda. O país se prepara agora para utilizar a segunda vacina aprovada.

Análise de James Gallagher, repórter de saúde e ciência da BBC News
A aprovação da vacina Oxford-AstraZeneca marca uma grande virada na pandemia.
Isso levará a uma expansão massiva na campanha de imunização do Reino Unido, com o objetivo de fazer a vida voltar ao normal.
A mudança para dar ao maior número possível de pessoas as primeiras doses de qualquer uma das vacinas aprovadas efetivamente dobra o número de pessoas que recebem alguma proteção.
A segunda dose, que dá proteção máxima, chegará até três meses depois.
No entanto, os próximos meses ainda parecem desanimadores.
Autoridades de saúde falaram de níveis “sem precedentes” de infecção e alguns hospitais estão lutando com o número de pacientes.
As restrições sob as quais todos vivemos provavelmente ficarão mais rígidas antes que as vacinas façam uma diferença tangível e nos coloquem no caminho da normalidade.

Quão eficaz é a vacina de Oxford?
Existem três números diferentes — 62%, 70% e 90%.
A primeira análise dos dados do ensaio mostrou que 70% das pessoas estavam protegidas contra os sintomas de covid-19 e ninguém desenvolveu doença grave ou precisou de tratamento hospitalar.
O número foi de apenas 62% quando as pessoas receberam duas doses completas e 90% quando receberam meia dose e depois uma completa.
A Agência Reguladora de Medicamentos e Produtos de Saúde do Reino Unido (MHRA, na sigla em inglês) aprovou duas doses completas da vacina Oxford-AstraZeneca.
No entanto, dados não publicados sugerem que deixar um intervalo maior entre a primeira e a segunda doses aumenta a eficácia geral da vacina.
Não havia dados suficientes para aprovar o uso de meia dose e dose completa.
Como ela funciona?
A vacina utiliza um vírus de resfriado comum geneticamente modificado que costumava infectar chimpanzés, um adenovírus.
Ele foi alterado para impedir que cause uma infecção em pessoas e para carregar partes do gene do coronavírus, entre elas a proteína spike (ou “de pico”).
Uma vez que essas moléculas estão dentro do corpo, começam a produzir a proteína spike do coronavírus que o sistema imunológico reconhece como ameaça e aprende a destruir.
Quando o sistema imunológico entra em contato com o vírus de verdade, agora sabe o que fazer.
Da BBC News Brasil