Por Wilton Emiliano Pinto *
Houve um tempo em que o telefone era feito de voz e silêncio. Cada ligação era como lançar uma ponte invisível por sobre a distância, carregando saudade, riso, e o calor de quem ouvia do outro lado. Não havia a urgência das respostas instantâneas. Entre uma chamada e outra, havia espaço para a espera — e a espera, às vezes, era um jeito bonito de amar. Cada conversa era quase um encontro sagrado, com seu tempo próprio, sua delicadeza. Mal sabia eu que aquelas vozes quentes e próximas dariam lugar, tão cedo, a telas frias e toques sem alma.
Hoje, passo os olhos pelos grupos de WhatsApp. Às vezes escrevo, às vezes só observo. E penso no quanto o mundo virou do avesso — ou talvez, apenas virou uma página. Se, há algumas décadas, alguém me dissesse que o “telefone mudo” seria o centro das nossas relações, eu teria achado graça. Naquele tempo, o e-mail já me parecia ousado demais, quase uma travessura da ciência. Mas o tempo, esse velho mestre silencioso, vai nos levando adiante — com ou sem o nosso consentimento.
CONECTADO, POREM DISTANTE
Já me peguei tantas vezes à mesa com amigos, com família, com gente querida, todos ali… e ainda assim, ausentes. Os olhos mergulhados nas pequenas telas, os dedos ocupados, as almas distraídas. A tecnologia, que nos prometeu aproximação, nos trouxe uma distância mais sutil — aquela que separa corpos presentes de corações ausentes. Estamos todos conectados, sim… mas será que ainda nos enxergamos? Vivemos lado a lado, mas às vezes parecemos ilhas cercadas por sinais de Wi-Fi.
Havia beleza no tempo em que a saudade se alimentava do silêncio e da ausência. O reencontro era quase um ritual. A voz amiga, depois de dias ou semanas, vinha como brisa leve, como abraço que atravessa o tempo. Cada palavra tinha peso, cada gesto, intenção. Hoje, trocamos dezenas de mensagens em minutos. Fotos, vídeos, emojis — tudo tão rápido. Mas será que tocamos, de verdade, o outro? A velocidade tem seu encanto… mas também rouba algo da profundidade.
O e-mail, antes símbolo do novo, virou quase peça de museu. A velha caixa de entrada, onde a gente esperava novidades com certa emoção, virou um lugar de recados esquecidos. Eu relutei, confesso. Da velha guarda, demorei a me render ao smartphone. Mas a vida tem um jeito sábio de nos ensinar que resistir nem sempre é nobre. Quando ganhei meu primeiro iPhone, entre curioso e desconfiado, fui desbravando esse novo território digital.
No início, era como aprender um novo idioma. Ícones, toques, gestos — tudo me soava estranho. Mas, com o tempo, como quem aprende a navegar em mar diferente, fui ganhando jeito. E não nego: reencontrei amigos que o tempo quase havia apagado. Descobri que a distância, às vezes, pode ser vencida por um simples clique. E isso também tem sua beleza.
Ainda assim, há algo que escapa. Algo que nenhuma notificação traduz, que nenhum toque de tela reproduz. É o calor de uma risada sincera, o aperto de mão, o abraço que fala mais do que palavras. Isso, a tecnologia ainda não conseguiu replicar — e talvez nunca consiga. Vivemos numa era em que tudo parece mais fácil, mas em que o simples “estar junto” virou um luxo. Um bem raro. Quase um milagre.
Talvez o segredo não esteja em negar o novo, mas em saber dosar. A tecnologia é um avanço, sim — mas precisa ser ponte, e não muro. Cercados por telas, não podemos esquecer que, por trás delas, há corações que esperam, sentem, vivem. Que possamos usar tudo isso com sabedoria, sem deixar de lado o que nos faz essencialmente humanos.
No fim das contas, é disso que se trata: os olhos que se encontram, as palavras ditas com o coração, o gesto que acolhe. Que entre mensagens digitadas e olhares distraídos, a gente ainda saiba valorizar o que é de verdade. O afeto. A presença. O amor que não cabe num emoji, mas transborda num toque.
