Presidente Hugo Motta libera R$ 11 milhões por deputado para reforçar apoio no Congresso, mas a decisão enfrenta desafios em meio à crise fiscal.
Emendas de comissão e a disputa pelo apoio no plenário
O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciou que cada parlamentar terá direito a direcionar R$ 11 milhões em emendas de comissão, recursos distribuídos pelas comissões do Congresso. Essa medida visa fortalecer a base aliada no plenário, em uma estratégia semelhante à utilizada por seu antecessor, Arthur Lira (PP-AL), que também usou as emendas para consolidar apoio.
Com esse valor adicional, os deputados poderão indicar como desejam que os R$ 11 milhões sejam aplicados, além dos R$ 37 milhões a que têm direito em emendas individuais. A cifra foi confirmada por seis parlamentares ouvidos pela Folha de S. Paulo. No processo, as comissões precisarão votar e registrar essas indicações em ata. As comissões de Saúde, Esporte e Turismo já abriram o cadastro para as indicações, mas ainda não há uma data para o fechamento do prazo.
O sigilo nas emendas e o novo regime de transparência
Além das emendas individuais e estaduais, as de comissão são uma das formas pelas quais os deputados direcionam recursos para suas bases eleitorais, buscando recompensas políticas e votos. No entanto, ao contrário das emendas impositivas, a liberação dos valores das comissões depende da aprovação do governo. Esse caráter discricionário das emendas sempre foi usado como moeda de troca no Congresso, favorecendo os aliados do governo e penalizando os opositores.
Durante os governos de Jair Bolsonaro (PL) e parte do governo Lula, as emendas de comissão eram pagas de forma sigilosa, com apenas a cúpula do Congresso ciente dos valores e destinos dos recursos. Esse modelo, que lembra as polêmicas emendas de relator ao Orçamento, foi substituído pelas emendas de comissão em 2024. No entanto, após uma série de investigações sobre desvio de verbas, o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do ministro Flávio Dino, determinou a adoção de regras de transparência e rastreabilidade. A exigência de fim do sigilo visa garantir maior fiscalização dos recursos públicos.
O cenário político e a pressão para cortes nas emendas
Com o fim do sigilo, tanto Motta quanto o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), precisarão coordenar com o governo a liberação dessas verbas, conforme as indicações feitas pelos parlamentares. A negociação das emendas já foi fonte de atritos no passado, como foi o caso entre Lira e o ex-ministro da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), Alexandre Padilha.
No entanto, em meio ao cenário fiscal complicado, com o governo enfrentando resistência em torno do aumento de impostos e da aprovação de outras medidas econômicas, ainda não há um consenso sobre a liberação dessas verbas. Interlocutores de Lula apontam que, apesar da divulgação de que cada deputado receberá R$ 11 milhões, o governo ainda está avaliando o impacto dessa decisão. A situação política pode influenciar a distribuição das emendas, especialmente em relação aos partidos que têm se posicionado contra essas práticas, como o PSOL e o Novo.
O dilema fiscal e a proposta de cortes nas emendas
Apesar de buscar fortalecer sua base no Congresso, Motta também sinalizou, recentemente, a necessidade de cortes nas emendas parlamentares como parte de um esforço para ajustar as contas públicas. Em declaração à CNN, ele defendeu uma reflexão sobre a redução dos gastos públicos, incluindo as emendas, como parte de um esforço conjunto para reduzir desperdícios no governo federal.
“Da mesma forma que estamos discutindo cortes em benefícios tributários, é fundamental que se discuta a redução das emendas e de outros gastos desnecessários”, afirmou Motta, reafirmando sua posição de não considerar as emendas parlamentares como “intocáveis”.
A distribuição das emendas de comissão é uma estratégia que reflete a dinâmica política da Câmara, mas também revela os desafios enfrentados pelo Congresso em meio à necessidade de ajustes fiscais. A transparência nas emendas e o alinhamento entre os poderes serão cruciais para garantir que os recursos sejam utilizados de forma eficiente e responsável. Resta saber se o Congresso estará disposto a abrir mão de suas prerrogativas para ajudar o governo a enfrentar o cenário econômico adverso.