A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro busca a remoção dos ministros Flávio Dino e Cristiano Zanin do julgamento sobre a suposta trama golpista, adotando uma estratégia baseada no regimento do Supremo Tribunal Federal (STF) com o objetivo de minimizar impactos negativos.
A previsão da equipe jurídica de Bolsonaro é de que ambos, indicados ao Supremo pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, votem favoravelmente ao recebimento da denúncia e, posteriormente, à condenação do ex-mandatário. Isso garantiria maioria ao relator Alexandre de Moraes na Primeira Turma, composta também por Cármen Lúcia e Luiz Fux.
Pelas regras do tribunal, caso Dino e Zanin sejam afastados ou fiquem impedidos por mais de um mês, seus substitutos seriam os ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli, os mais antigos da Segunda Turma. Embora considerados aliados de Moraes, ambos pertencem ao segmento mais pragmático do STF, o chamado “Centrão do Supremo”, o que faz com que a defesa de Bolsonaro veja neles uma possibilidade de votos favoráveis, dependendo do cenário político.
Um interlocutor próximo ao ex-presidente argumenta que Mendes é um experiente articulador e que sua posição pode variar conforme o ambiente político, citando a queda da popularidade de Lula apontada em recentes pesquisas eleitorais. Gilmar Mendes, que já foi um defensor da Lava Jato, alterou sua postura quando a operação passou a atingir políticos do Centrão e da direita. Toffoli, por sua vez, tem um histórico de aproximações estratégicas, tendo se alinhado a Bolsonaro durante sua gestão no STF e, posteriormente, reaproximado-se de Lula.
Aliados de Bolsonaro avaliam que, mantida a atual composição da Primeira Turma, a condenação do ex-presidente deve ocorrer por unanimidade. No entanto, a eventual substituição de Dino e Zanin por Mendes e Toffoli poderia resultar em um placar de 3 a 2, permitindo que a defesa recorresse com embargos infringentes e levasse a decisão ao plenário do Supremo.
Apesar da estratégia, existem entraves significativos. Para viabilizar a substituição, seria necessário que Dino e Zanin se declarassem impedidos ou que o STF determinasse seu afastamento, cenário considerado improvável, pois não há precedentes de afastamento compulsório de ministros em situações semelhantes. Fontes internas do Supremo ponderam que a Primeira Turma poderia continuar funcionando com apenas três ministros, sem necessidade de substituição.
Os advogados de Bolsonaro argumentam que Dino já moveu ação contra o ex-presidente quando era governador do Maranhão e que, como ministro da Justiça no governo Lula, fez declarações públicas responsabilizando Bolsonaro pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
“A responsabilidade política (de Bolsonaro) não há a menor dúvida, porque ele era o inspirador. Seu silêncio após a eleição, o não reconhecimento do resultado, as reuniões que houve. Quem revelou as reuniões? Senadores, deputados, parlamentares que integram a sua base de apoio e revelam reuniões golpistas nos palácios presidenciais com a presença do presidente da República”, disse Dino em entrevista ao programa Opera Mundi em fevereiro de 2023.
Zanin, por sua vez, foi advogado da campanha petista na eleição de 2022, atuando em processos que buscavam a condenação de Bolsonaro por abuso de poder político e econômico. O ex-presidente já foi declarado inelegível por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) devido a atos como a reunião com embaixadores para desacreditar o sistema eleitoral e a utilização das celebrações do Bicentenário da Independência para promover sua candidatura.
Bolsonaro tentou, sem sucesso, afastar Alexandre de Moraes da condução do caso, alegando que as investigações indicavam que o ministro estaria entre os alvos de uma suposta tentativa de golpe, o que comprometeria sua imparcialidade. Agora, a ofensiva contra Dino e Zanin segue a mesma linha, buscando construir a narrativa de que o julgamento do ex-presidente é essencialmente político e que ele seria alvo de perseguição judicial.
O STF informou que Dino e Zanin não vão se manifestar sobre os questionamentos. Em declaração a jornalistas, Dino afirmou que o julgamento de Bolsonaro ocorrerá conforme as regras legais, com imparcialidade e respeito à ampla defesa.
“Em relação a mim, não há nenhum desconforto, nenhum incômodo, nada nesse sentido, porque considero que os advogados dele e de todos os demais denunciados têm, não só o direito, como o dever de exercer a ampla defesa”, declarou o ministro.
( Com Malu Gaspar | O GLOBO )
