Liminar do ministro do Supremo muda interpretação histórica da lei de 1950 e reduz espaço para iniciativas de cidadãos e parlamentares contra integrantes da Corte
O ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes concedeu decisão liminar estabelecendo que apenas a Procuradoria-Geral da República tem legitimidade para apresentar pedidos de impeachment contra ministros da Corte. A medida altera de forma profunda a prática até então adotada, que permitia a qualquer cidadão protocolar esse tipo de requerimento perante o Senado.
Especialistas apontam que, na prática, a decisão funciona como um filtro institucional. Um levantamento simples no sistema do Senado Federal mostra centenas de pedidos acumulados, muitos deles direcionados a ministros específicos — com destaque para Alexandre de Moraes. Com a liminar, esse fluxo tende a ser interrompido, uma vez que somente manifestações formais da PGR poderão dar início a eventual tramitação.
Fundamentos da decisão
A decisão, com cerca de 70 páginas, foi proferida em resposta a uma ação apresentada pelo partido Solidariedade. No texto, Gilmar Mendes sustenta que submeter magistrados a processos de responsabilização por divergências interpretativas violaria o princípio da independência judicial.
O ministro afirma que transformar desacordos jurídicos em hipóteses de crime de responsabilidade comprometeria a autonomia do Judiciário e abriria espaço para a criminalização da atividade hermenêutica, pilar do exercício da jurisdição constitucional.
Releitura da lei do impeachment
A liminar promove uma inflexão relevante na interpretação da Lei nº 1.079, de 1950 — o mesmo diploma jurídico que embasou o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Até agora, a leitura predominante era a de que qualquer cidadão poderia oferecer denúncia por crime de responsabilidade, inclusive contra ministros do Supremo.
Com o novo entendimento, a legitimidade ativa passa a ser exclusiva do chefe do Ministério Público Federal, concentrando o poder de iniciativa em um único órgão e reduzindo a atuação direta da sociedade e de agentes políticos nesse tipo de procedimento.
Efeitos no cenário político
O impacto da decisão vai além do campo jurídico e alcança diretamente o debate político, sobretudo diante das articulações para as eleições de 2026. Setores da oposição vinham tratando a disputa pelo Senado como estratégica, com o objetivo declarado de formar maioria capaz de impulsionar processos de impeachment contra ministros do STF.
Esse discurso, defendido de forma aberta por lideranças do PL, perde força diante da nova limitação imposta pela liminar. Especialistas avaliam que a decisão pode redesenhar prioridades de campanha e até se tornar um elemento de negociação política nos próximos anos.
Para analistas, embora ainda sujeita a confirmação pelo plenário do Supremo, a medida já sinaliza uma mudança estrutural na relação entre os Poderes e no uso do impeachment como instrumento de pressão institucional.



