Relatório divulgado às vésperas da COP30 aponta recordes de temperatura, gases de efeito estufa e colapso de geleiras
Aquecimento global atinge novos extremos
A Organização Meteorológica Mundial (OMM) alertou nesta quarta-feira (6) que 2025 deve figurar entre o segundo e o terceiro anos mais quentes já registrados, mantendo a tendência de aquecimento extremo que marca a última década.
O relatório, divulgado poucos dias antes da abertura da COP30 em Belém (PA), indica que as concentrações de gases do efeito estufa e o calor acumulado nos oceanos alcançaram níveis inéditos. Geleiras e calotas polares continuam em retração acelerada, reforçando o cenário de crise climática global.
“Essa sequência sem precedentes de altas temperaturas, somada ao recorde de gases de efeito estufa no ano passado, mostra que será praticamente impossível limitar o aquecimento global a 1,5 °C nos próximos anos sem ultrapassar temporariamente essa meta”, afirmou Celeste Saulo, secretária-geral da OMM.
Ela, no entanto, ressaltou que “a ciência é igualmente clara: ainda é possível — e essencial — reduzir as temperaturas para 1,5 °C até o final do século”.
Metas do Acordo de Paris em risco
O limite de 1,5 °C foi estabelecido pelo Acordo de Paris em 2015 como forma de conter impactos severos do clima, como secas prolongadas, elevação do nível do mar e derretimento de geleiras. No entanto, estudos recentes apontam que o mundo pode já ter ultrapassado esse ponto crítico.
Durante a Cúpula dos Líderes, em Belém, o secretário-geral da ONU, António Guterres, citou o relatório da OMM e fez novo apelo por ação global. “Em cada ano em que se ultrapassar o limiar de 1,5 °C, as economias serão afetadas, as desigualdades se agravarão e ocorrerão danos irreversíveis”, afirmou.
Guterres reforçou que “agir agora, de forma rápida e em larga escala, é fundamental para manter o aumento o menor e mais curto possível e garantir que as temperaturas voltem a ficar abaixo de 1,5 °C antes do final do século”.
A OMM informou que, entre janeiro e agosto de 2025, a temperatura média global ficou 1,42 °C acima dos níveis pré-industriais, ligeiramente abaixo do recorde de 2024 (1,55 °C). Ainda assim, os últimos 11 anos — de 2015 a 2025 — compõem a série mais quente já observada desde o início dos registros, há 176 anos.
Gases do efeito estufa quebram novos recordes
As concentrações de dióxido de carbono (CO₂), metano (CH₄) e óxido nitroso (N₂O) atingiram novos recordes históricos. O CO₂ chegou a 423,9 partes por milhão (ppm) em 2024, com aumento inédito de 3,5 ppm em apenas um ano, segundo medições em Mauna Loa (EUA) e Kennaook/Cape Grim (Austrália).
Desde 1750, o nível de CO₂ subiu 53%, o de metano aumentou 166% e o de N₂O, 25%. A OMM ressalta que a queima de combustíveis fósseis continua sendo a principal fonte dessas emissões.
O relatório também destaca que o fenômeno El Niño, ativo entre 2023 e 2024, deu lugar a uma fase neutra ou de La Niña em 2025. Ainda assim, o planeta viveu 26 meses consecutivos de recordes mensais de calor — de junho de 2023 a agosto de 2025, com exceção de fevereiro deste ano.
Oceanos em aquecimento e colapso de geleiras
O calor armazenado nos oceanos atingiu, em 2024, o maior nível da história, superando o de 2023 em 16 zetajoules — uma quantidade equivalente a bilhões de trilhões de joules. Mais de 90% do excesso de energia fica retido nos mares, o que intensifica tempestades, acelera o derretimento das calotas polares e eleva o nível do mar.
Desde 1993, a taxa média de aumento do nível dos oceanos dobrou, passando de 2,1 milímetros por ano para 4,1 milímetros anuais entre 2016 e 2025. Em 2024, o nível médio global chegou ao ponto mais alto já registrado por satélites.
O gelo do Ártico alcançou, em março de 2025, sua menor extensão máxima da série histórica, com 13,8 milhões de km². Já a Antártida manteve-se bem abaixo da média, com o terceiro menor volume já observado tanto no verão quanto no inverno.
A retração das geleiras também bateu recordes. No ano hidrológico de 2023/2024, houve perda média de 1,3 metro de gelo — o equivalente a 450 gigatoneladas, a maior redução desde 1950. A Venezuela, segundo o relatório, perdeu seu último glaciar, tornando-se, junto da Eslovênia, um dos primeiros países do mundo sem geleiras em tempos modernos.
Clima extremo afeta economias e populações
Os efeitos do aquecimento global se intensificaram em 2025, com uma sucessão de desastres naturais de grandes proporções.
Nos Estados Unidos, enchentes no Texas, em julho, deixaram 135 mortos — o pior desastre do tipo em quase meio século. Na Europa e no Mediterrâneo, uma onda de calor entre junho e agosto elevou as temperaturas a 50,5 °C na Turquia, provocando incêndios em 400 mil hectares e afetando a agricultura e o turismo.
Na África, ciclones e inundações devastaram Moçambique, a República Democrática do Congo e a África do Sul, deixando milhares de pessoas desabrigadas. Já na Ásia, enchentes atingiram o Paquistão e a Índia, forçando o deslocamento de mais de 1,5 milhão de pessoas.
No Brasil, a seca prolongada voltou a castigar a Amazônia e o Centro-Sul, agravando incêndios florestais e pressionando reservatórios de água e sistemas de energia.
Do outro lado do planeta, China, Japão e Coreia registraram o verão mais quente da história, com termômetros próximos dos 45 °C.
“Os eventos extremos de 2025 estão prejudicando plantações, agravando a pobreza e forçando deslocamentos em várias regiões”, aponta o relatório.
Energia sob pressão e falta de sistemas de alerta
Além dos impactos ambientais, o calor extremo afetou diretamente a infraestrutura energética mundial. Em 2024, a demanda global de energia subiu 4%, e em algumas regiões da África, o aumento chegou a 30% acima da média histórica.
Para a OMM, é urgente integrar dados climáticos à geração e distribuição de energia renovável, criando sistemas mais resilientes diante das rápidas mudanças climáticas.
O relatório também mostra avanços desiguais na prevenção de desastres: o número de países com sistemas de alerta precoce de múltiplos riscos mais que dobrou na última década — de 56 em 2015 para 119 em 2024. Ainda assim, 40% do planeta permanece sem cobertura adequada para responder a emergências com antecedência.

