Ministro do STF aponta atuação coordenada de núcleos que tentaram manter Bolsonaro no poder após derrota eleitoral
Voto do relator
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta terça-feira (21) pela condenação de sete integrantes do núcleo 4, responsável por ações de desinformação associadas à chamada trama golpista. Em apenas um caso, Moraes considerou a denúncia parcialmente procedente, condenando o réu por dois crimes específicos.
Segundo o relator, as provas confirmam que o grupo desempenhou papel estratégico na tentativa de manter o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no poder após as eleições de 2022, por meio da disseminação de informações falsas e ataques a autoridades, com o objetivo de gerar instabilidade social e viabilizar uma intervenção institucional.
Ainda devem apresentar votos na Primeira Turma os ministros Cristiano Zanin, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Flavio Dino. A condenação será confirmada caso três ministros aprovem a acusação.
Novo populismo digital e ataques às instituições
Moraes classificou a atuação do grupo como expressão do que chamou de “novo populismo digital extremista”, caracterizado por uma rede organizada de desinformação e ataques às instituições democráticas.
O ministro criticou a tentativa de justificar as ações como liberdade de expressão:
“É uma falácia, é uma mentira absurda, criminosa e antidemocrática dizer que ataques à Justiça Eleitoral, ao Poder Judiciário e à democracia configuram liberdade de expressão. Isso é crime tipificado no Código Penal.”
Segundo Moraes, redes sociais e aplicativos de mensagens foram usados como instrumentos de agressão e disseminação de discurso de ódio:
“Tratou-se de uma propagação sistemática e organizada de informações falsas contra as instituições democráticas.”
Uso de órgãos de Estado para fins ilícitos
O relator destacou o emprego ilegal do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para abastecer milícias digitais com informações falsas:
“Houve utilização da estrutura do GSI e da Abin pela organização criminosa para produção e divulgação massiva de desinformação sobre supostas fraudes nas urnas eletrônicas, com clara intenção de deslegitimar a Justiça Eleitoral e o Poder Judiciário.”
Moraes ressaltou que o uso dessas estruturas evidencia o caráter político-criminal do grupo:
“As finalidades demonstram o caráter criminoso da organização, que produziu desinformação e realizou investigações ilegais contra autoridades públicas para restringir o exercício de poderes constitucionais da República.”
Gabinete de crise e tentativa de golpe
O ministro também apontou que o grupo planejou a criação de um gabinete de crise para ser instalado após a derrubada do governo eleito:
“É a primeira vez na história democrática que se imprime no Palácio do Planalto um gabinete de crise com o objetivo de substituir um governo legitimamente eleito.”
Para Moraes, as provas indicam conexão direta entre os núcleos e a tentativa de manter um projeto político no poder por meio da instabilidade social:
“Todos os atos da organização visavam corroer o sistema democrático, gerar levante contra as instituições e justificar um Estado de exceção.”
Comunicação e articulação entre os núcleos
O relator enfatizou a atuação coordenada entre os diferentes núcleos:
“Olhando o conjunto, é evidente que todos os núcleos se comunicavam e atuavam em diversas frentes. Mensagens, documentos e planos, como a Operação Copa 2022 e o planejamento Punhal Verde-Amarelo, demonstram interligação e tentativa de tomada de assalto da República.”
Réus do núcleo 4 e acusações
Integram o núcleo 4:
- Ailton Moraes Barros, ex-major do Exército;
- Ângelo Denicoli, major da reserva do Exército;
- Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, presidente do Instituto Voto Legal;
- Giancarlo Rodrigues, subtenente do Exército;
- Guilherme Almeida, tenente-coronel do Exército;
- Marcelo Bormevet, agente da Polícia Federal;
- Reginaldo Abreu, coronel do Exército.
Eles respondem por cinco crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), os réus utilizaram a estrutura da Abin para espionagem política, criação e disseminação de informações falsas contra eleições, autoridades e instituições democráticas. Para o procurador-geral, Paulo Gonet, essas ações resultaram na invasão e destruição das sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023, sendo pedida a condenação dos sete acusados.
Este é o segundo grupo de réus julgado pela Primeira Turma. Em setembro, o colegiado já havia condenado outros sete aliados de Bolsonaro, incluindo militares de alta patente, por tentativa de golpe de Estado.