Para a Justiça, a gigante da tecnologia impôs condutas que limitaram a concorrência e afetaram o acesso à informação na web
Decisão judicial aponta práticas anticompetitivas que prejudicaram editoras e consumidores; ações da Alphabet caem após anúncio
A Justiça dos Estados Unidos concluiu que o Google manteve ilegalmente um monopólio em partes do mercado de publicidade digital, por meio de condutas anticompetitivas voltadas à manutenção de seu domínio em sistemas de anúncios na internet. A decisão foi proferida nesta quinta-feira (17) pela juíza Leonie Brinkema, do Tribunal Distrital do Leste da Virgínia.
Segundo a magistrada, a gigante da tecnologia violou leis antitruste em dois segmentos-chave: as chamadas bolsas de anúncios (ad exchanges) e os servidores de anúncios (ad servers), utilizados por sites para vender espaços publicitários. A empresa, no entanto, foi absolvida da acusação de monopolizar o mercado de ferramentas empregadas por anunciantes para compra de anúncios gráficos.
A sentença representa um revés significativo para o Google, atingindo uma das áreas mais lucrativas de sua operação. As ações da Alphabet, controladora da companhia, caíram 3,2% logo após a divulgação do veredito, enquanto a Trade Desk — concorrente no setor de publicidade digital — teve alta de quase 8%.
“Conduta excludente” comprometeu o mercado digital, diz juíza
Em uma decisão de 115 páginas, a juíza Brinkema afirmou que “o Google engajou-se intencionalmente em uma série de ações anticompetitivas para adquirir e manter o poder de monopólio” nos dois mercados citados. Ela destacou que, ao longo de mais de uma década, a empresa vinculou seus servidores de anúncios à sua própria bolsa, “por meio de políticas contratuais e integração tecnológica”.
Essa estratégia, segundo a magistrada, consolidou o domínio da companhia, limitando a concorrência e afetando negativamente o ecossistema digital: “Além de privar concorrentes da capacidade de competir, essa conduta excludente prejudicou substancialmente os clientes editores do Google, o processo competitivo e, em última instância, os consumidores de informação na rede aberta.”
Mercado bilionário e alvo de pressão regulatória
O julgamento se concentra em uma complexa engrenagem tecnológica que sustenta os leilões de espaços publicitários em sites — processo que ocorre em milissegundos a cada nova visita a uma página. Grande parte desse sistema é gerenciado pelo Google Ad Manager, software que surgiu com a aquisição da empresa DoubleClick, comprada por US$ 3,1 bilhões em 2008.
Atualmente, o Google detém 87% do mercado de tecnologia para venda de anúncios, segundo dados apresentados pelo governo norte-americano. Em 2023, esse setor movimentou cerca de US$ 31 bilhões, o equivalente a 10% do faturamento da Alphabet.
Durante o julgamento, realizado em setembro, o Departamento de Justiça dos EUA argumentou que o Google utilizava sua posição para forçar editores a adotarem seus softwares, ao mesmo tempo em que aumentava sua margem de lucro ao centralizar as operações. Isso, na visão do governo, afetava diretamente os veículos de mídia que produzem conteúdo gratuito na web.
Editoras e anunciantes relataram prejuízos durante julgamento
O governo convocou representantes de grandes editoras e agências de publicidade para reforçar os impactos negativos do monopólio. Ex-funcionários da News Corp, da Gannett e de outras empresas relataram como a concentração de mercado imposta pela gigante afetou suas receitas e reduziu opções tecnológicas viáveis.
“Esses são os mercados que tornam possível uma internet livre e aberta”, afirmou o advogado do Departamento de Justiça, Aaron Teitelbaum, nos argumentos finais do julgamento.
A defesa do Google sustentou que a empresa enfrenta concorrência de outras plataformas de anúncios digitais, como redes sociais e serviços de streaming. Também citou decisão da Suprema Corte de 2004, segundo a qual companhias têm o direito de escolher com quem fazer negócios.
Outros processos e crescente pressão sobre big techs
A sentença representa o segundo revés judicial expressivo enfrentado pelo Google em menos de um ano. Em agosto de 2024, um juiz federal já havia decidido que a empresa monopolizava ilegalmente o mercado de buscas online. Nesse caso, o Departamento de Justiça defende o desmembramento da Alphabet, com julgamento sobre as medidas corretivas previsto para começar na próxima segunda-feira (21), em Washington.
Além disso, o Google é alvo de outras ações antitruste. Em uma delas, o governo norte-americano pede a venda do navegador Chrome. A ofensiva faz parte de uma mobilização mais ampla das autoridades para limitar o poder das grandes empresas de tecnologia.
Apple, Amazon e Meta também estão na mira. A Apple foi acusada de dificultar a saída de usuários de seu ecossistema; a Amazon, de prejudicar pequenos vendedores; e a Meta, de eliminar concorrentes ao adquirir plataformas como Instagram e WhatsApp — caso cujo julgamento teve início nesta semana.
( Com Bloomberg )