O embate entre Donald Trump e Volodimir Zelenski atingiu um novo patamar na quarta-feira (19).
Um dia depois de Trump classificar o líder ucraniano como “ditador”, a Rússia realizou um dos maiores ataques aéreos desde o início da guerra, há três anos, enquanto os Estados Unidos aumentavam a pressão sobre Kiev.
Diante desse cenário, Zelenski recuou. Após um encontro tenso com o enviado americano Keith Kellogg, que se recusou a conceder uma entrevista conjunta, o presidente ucraniano afirmou estar “pronto para negociar um acordo forte e útil” com os EUA, incluindo salvaguardas contra futuras agressões russas.
Poucos detalhes foram divulgados sobre a conversa entre os dois. Paralelamente, o presidente francês, Emmanuel Macron, defendeu a criação de uma força de paz europeia para prevenir novos ataques em caso de um cessar-fogo. O primeiro-ministro da França, François Bayrou, classificou a situação como um “risco existencial” e “a maior ameaça de guerra desde 1945”.
A proposta de uma força de paz composta por integrantes da Otan, levantada pelo Reino Unido no início da semana, foi prontamente rejeitada pelo Kremlin, que a considerou “inaceitável”.
A crise entre Trump e Zelenski se agravou após o americano excluir a Ucrânia e a Europa das negociações diretas que estabeleceu com Vladimir Putin para tratar do conflito e de outras questões. Trump acusou Zelenski de viver em uma “bolha desinformativa” e criticou a recusa da Ucrânia em aceitar uma oferta americana de apoio militar em troca de US$ 500 bilhões em minerais ucranianos. Em resposta, Trump questionou a legitimidade de Zelenski, reforçou sua retórica contra o líder ucraniano e exigiu que ele aceitasse negociar.
Líderes europeus, como os premiês Olaf Scholz (Alemanha) e Keir Starmer (Reino Unido), saíram em defesa de Zelenski. O porta-voz da União Europeia, Stefan de Keersmaecker, afirmou: “A Ucrânia é uma democracia. A Rússia de Putin, não”.
O governo americano manteve a pressão. O conselheiro de Segurança Nacional de Trump, Mike Waltz, declarou à Fox News que os ucranianos “precisam baixar o tom e assinar aquele acordo” sobre a cessão de minerais. Segundo ele, um acordo ainda é possível. Kellogg, por sua vez, evitou declarações, permitindo apenas o registro do início de sua reunião com Zelenski, que sugeriu abertura para discutir investimentos, sem detalhar sua posição sobre a questão dos minerais.
Enquanto isso, a Rússia intensificou suas ofensivas. Durante a noite, um ataque atingiu instalações de gás em Kharkiv, no norte da Ucrânia, e uma usina de energia na região de Odessa, no sul, utilizando 163 drones e 14 mísseis. Kiev afirmou ter abatido 80 dos drones. Esse foi o segundo grande ataque da semana.
Questionado sobre um plano franco-britânico, divulgado pelo jornal The Telegraph, para enviar até 30 mil militares ocidentais à Ucrânia, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, alertou: “Isso causa preocupação para nós, estamos monitorando bem de perto. É inaceitável”.
Segundo a proposta, esses militares não estariam na linha de frente, mas sim em cidades estratégicas na retaguarda de uma zona desmilitarizada, similar à existente entre as Coreias desde 1953. As bases seriam Krivii Rii, Poltava e Dnipro, esta última uma região rica em minerais e alvo de um teste de mísseis russos em novembro.
Na véspera, o chanceler russo, Serguei Lavrov, afirmou que a presença de tropas ocidentais na Ucrânia representaria uma “ameaça direta à Rússia”. Entre as justificativas de Putin para a invasão de 2022 estava o temor de que a Ucrânia se unisse à Otan. Agora, Trump, líder da maior potência da aliança, demonstra concordância com essa preocupação.
Diante desse cenário, Macron convocou reuniões com líderes franceses para discutir próximos passos. A Europa, escanteada por Trump nas negociações, busca recuperar protagonismo. O líder francês suavizou a crítica ao americano, dizendo que ele “apenas acelerou o processo porque quer ver os acordos feitos”.
Os europeus consideram oferecer garantias à Ucrânia, mas essa possibilidade é rechaçada pelo Kremlin. Enquanto isso, Trump reforça a pressão sobre seus aliados, exigindo que todos os países da Otan atinjam a meta de 2% do PIB em gastos militares até a cúpula da aliança, em junho. Atualmente, oito dos 32 membros ainda não cumprem esse requisito.