A presidência pro tempore de Javier Milei termina com propostas controversas, enquanto o Brasil tenta restabelecer temas centrais como mudanças climáticas e direitos humanos.
A presidência pro tempore de Javier Milei, que chega ao fim nesta quinta-feira (02), no contexto da cúpula de chefes de Estado do Mercosul em Buenos Aires, deixa um cenário de intensas divergências internas dentro do bloco. Com um governo argentino cada vez mais voltado para questões de segurança e comércio, o bloco enfrenta desafios significativos em relação à Venezuela, à política interna dos seus membros e à agenda internacional.
Venezuela e as divergências no Mercosul
Durante os últimos meses, as tensões sobre como lidar com a crise venezuelana se intensificaram. A proposta de Milei de elaborar uma declaração “em tom duro” contra o regime de Nicolás Maduro pode não ser incluída na declaração final da cúpula, caso não haja consenso entre os membros do bloco, que inclui Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia. A crescente polarização dentro do Mercosul, onde Argentina e Paraguai estão cada vez mais alinhados ideologicamente, evidencia as fraturas internas do bloco.
O Mercosul sob a presidência de Milei: foco em comércio e segurança
Em sua presidência pro tempore, o governo de Milei tem priorizado temas como comércio e segurança, deixando de lado debates sobre questões sociais, ambientais e direitos humanos. Uma das principais iniciativas do governo argentino foi a proposta de criar uma agência de combate ao crime organizado, que, segundo fontes argentinas, será apresentada na cúpula de chefes de Estado. Embora o Brasil apoie, em princípio, a ideia, há preocupações quanto ao modelo que será adotado, especialmente após comparações com a abordagem de segurança de El Salvador.
O governo brasileiro, cauteloso, afirmou que não apoiará uma abordagem que se assemelhe ao modelo autoritário do presidente Nayib Bukele. “Não podemos apoiar iniciativas que desrespeitem os direitos humanos”, afirmou uma fonte do governo brasileiro.
Avanços econômicos e desafios políticos
Apesar das divergências políticas, o governo Milei fez avanços na área econômica, com a finalização de uma negociação importante para flexibilizar a Tarifa Externa Comum (TEC), que estabelece taxas para produtos de fora do Mercosul. Este acordo permitirá à Argentina ampliar as negociações bilaterais com outros países, como os Estados Unidos.
Com a vitória de Milei, o risco de uma saída da Argentina do Mercosul foi afastado, o que é visto como um alívio para o Brasil. O governo argentino tem se comprometido a fortalecer a institucionalização do bloco, com a criação da agência de combate ao crime organizado, como forma de garantir a continuidade do Mercosul.
COP30 e o futuro do Mercosul
Com a presidência pro tempore do Brasil se aproximando, a agenda de mudanças climáticas será um dos pontos centrais a serem discutidos. O governo Lula tem se preparado para retomar os debates sobre a sustentabilidade ambiental e os compromissos do Mercosul com a COP30, que ocorrerá em Belém no final deste ano. “O Brasil não pode deixar de falar sobre o clima neste momento crucial para aumentar o apoio à COP30”, afirmou uma fonte do governo brasileiro.
Contudo, a posição do governo Milei, que tem demonstrado resistência a temas como políticas sociais e direitos humanos, indica que a delegação argentina terá uma postura menos entusiasta sobre essas questões. Apesar das limitações, o Brasil parece determinado a trabalhar dentro do possível, focando na continuidade das negociações que favoreçam os interesses do bloco.
Relações Brasil-Paraguai: tensão no horizonte
Enquanto o Brasil enfrenta um momento de tensão com o Paraguai, principalmente devido a divergências sobre as negociações relacionadas a Itaipu e a abertura de uma investigação criminal contra a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), a relação entre Argentina e Paraguai continua a se estreitar. A postura do governo paraguaio, liderado por Santiago Peña, tem se intensificado, com referências à Guerra do Paraguai e críticas contínuas ao Brasil, aprofundando as fissuras dentro do Mercosul.
Conclusão: o futuro incerto do Mercosul
À medida que o Mercosul atravessa essas tensões internas, fica claro que as divergências políticas e ideológicas entre os seus membros dificultam a construção de uma agenda comum. Embora o bloco continue sendo uma plataforma comercial importante, a falta de consenso sobre questões-chave, como direitos humanos, mudanças climáticas e políticas sociais, ameaça sua coesão a longo prazo. A presidência de Milei deixa um Mercosul dividido, mas com a esperança de que, sob a liderança do Brasil, seja possível retomar o diálogo e fortalecer os laços comerciais e institucionais no futuro próximo.