A medida, que surpreendeu aliados, advogados e familiares, ampliou a pressão por definição de um nome competitivo, mas também impôs obstáculos às conversas com o próprio Bolsonaro, cuja influência permanece decisiva.
A prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), decretada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), completa uma semana nesta segunda-feira (11) e já provoca efeitos significativos sobre as articulações políticas da direita para a sucessão presidencial de 2026.
Isolamento compromete articulações políticas
Bolsonaro foi colocado em prisão domiciliar após descumprir medida cautelar ao participar, por videochamada, de um ato bolsonarista no Rio de Janeiro. A antecipação da medida, que seus aliados esperavam apenas após o trânsito em julgado de uma eventual condenação no caso da trama golpista, interrompeu sua rotina de viagens, reuniões e telefonemas com lideranças políticas.
Segundo interlocutores, o ex-presidente continua sendo o principal fiador de qualquer candidatura no campo da direita, e seu isolamento dificulta a construção de consensos. A avaliação entre aliados é que abordar o tema sucessório neste momento pode soar oportunista e insensível, dada a fragilidade política e pessoal de Bolsonaro.
Michelle Bolsonaro ganha protagonismo, mas enfrenta resistência
Nos primeiros dias de reclusão, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro foi a principal interlocutora do ex-presidente. Presidente do PL Mulher, ela não participa diretamente das articulações eleitorais e enfrenta limitações de trânsito político. Apesar disso, pesquisa recente do Datafolha aponta que Michelle tem desempenho superior ao dos filhos de Bolsonaro em eventual disputa contra o presidente Lula (PT). Ainda assim, o cenário mais provável é sua candidatura ao Senado pelo Distrito Federal.
Flávio Bolsonaro e aliados próximos assumem papel estratégico
Com a autorização para visitas familiares, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) passou a desempenhar papel central nas conversas sobre o futuro político do pai. Além dele, o presidente do PP, Ciro Nogueira (PI), e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), também estiveram com Bolsonaro na primeira semana de prisão domiciliar.
Ciro Nogueira permaneceu cerca de meia hora com o ex-presidente e, ao deixar o condomínio no Jardim Botânico, afirmou: “Vi que, apesar de triste, nosso capitão continua inabalável acreditando no nosso Brasil e confiando em Deus”. A interlocutores, o senador demonstrou preocupação com o estado emocional de Bolsonaro, que apresenta semblante abatido e ainda sofre com crises de soluço. Médicos devem visitá-lo nos próximos dias.
Tarcísio evita confronto com STF e mantém canal com Bolsonaro
Na quinta-feira (7), Tarcísio de Freitas esteve com Bolsonaro por quase duas horas. Segundo o governador, o encontro foi positivo e o ex-presidente estava “sereno”. Aliados garantem que não houve discussão sobre 2026, e que o foco permanece na tentativa de reverter a prisão.
Tarcísio evita críticas diretas ao ministro Alexandre de Moraes, com quem mantém boa relação, e também se distancia de temas como o tarifaço, que desgastaram a imagem da direita após a atuação de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos Estados Unidos. A postura o afasta do bolsonarismo mais radical, mas agrada setores do empresariado.
Apesar de declarar que pretende disputar a reeleição em São Paulo, Tarcísio mantém canal direto com Bolsonaro e deve manter agenda periódica em Brasília para conversas privadas, caso a prisão se prolongue. Aliados avaliam que, se for escolhido como sucessor, será essencial preservar o alinhamento político com o ex-presidente.
Direita busca unidade em meio à crise institucional
A prisão de Bolsonaro coincidiu com uma tentativa de reunificação de governadores da direita, em encontro realizado na casa de Ibaneis Rocha (MDB), chefe do Executivo do Distrito Federal. O grupo criticou o governo Lula pela condução do tarifaço e o STF por aquilo que classificam como “crise institucional”.
Embora o objetivo inicial não fosse discutir a sucessão presidencial, o tema surgiu durante a reunião. Segundo relato publicado pela Folha de S.Paulo, o governador Mauro Mendes (União Brasil-MT) afirmou que “o próximo presidente do Brasil estava na reunião”. E completou: se não estivesse, e a esquerda permanecesse no poder, “os responsáveis também estariam ali”.
Ausência em atos gera atrito entre bolsonaristas
A ausência de nomes como Ratinho Jr (PSD-PR), Romeu Zema (Novo-MG) e Ronaldo Caiado (União-GO) nos atos bolsonaristas do último domingo foi criticada por Flávio Bolsonaro, que classificou a decisão como “erro estratégico grande”, em entrevista à Folha de S.Paulo.
A tensão entre os diferentes grupos da direita revela os desafios para a construção de uma candidatura unificada em 2026, especialmente diante da inelegibilidade de Bolsonaro e da fragmentação interna do campo conservador.