Brasileiros estão entre os mais afetados por nova diretriz do governo; mudança ocorre após fim da “manifestação de interesse”
O governo de Portugal iniciou uma ampla operação para redefinir sua política migratória, determinando a expulsão de 33.983 estrangeiros que tiveram pedidos de residência negados. Entre os notificados, 5.368 são brasileiros, que deverão deixar o país em até 20 dias após o recebimento da comunicação oficial.
A medida representa uma guinada na postura portuguesa em relação à imigração. Até recentemente, o país era reconhecido por adotar políticas de acolhimento, mas as recentes mudanças implementadas pela coalizão Aliança Democrática (AD), liderada pelo primeiro-ministro Luís Montenegro, priorizam o controle migratório e o endurecimento nas condições para permanência de estrangeiros.
Fim da política de portas abertas
Um dos principais marcos dessa reviravolta foi a revogação do mecanismo conhecido como “manifestação de interesse”, em vigor até 3 de junho de 2024. O dispositivo permitia que estrangeiros que estivessem em Portugal para estudar ou buscar trabalho solicitassem residência, mesmo sem contrato de trabalho.
Com a sua revogação, os novos pedidos de residência exigem comprovação prévia de vínculo empregatício. Segundo o governo português, essa medida integra a agenda do Partido Social Democrata (PSD), que defende maior controle nas fronteiras e criticou a política anterior, adotada pelos socialistas, de incentivo à imigração.
Para saber mais sobre a “manifestação de interesse”, veja esta explicação do Consulado de Portugal.
Acelerando as análises e notificações
Segundo dados da Agência para Integração, Migração e Asilo (Aima), até junho de 2024 havia cerca de 446 mil pedidos em tramitação, dos quais 165 mil foram cancelados por inadimplência. Restaram, portanto, 281 mil solicitações que passaram a ser processadas de forma acelerada por uma força-tarefa criada pelo atual governo.
A operação envolveu 1.400 funcionários públicos e parceiros, além da abertura de 25 centros de atendimento, o que ampliou em sete vezes a capacidade de análise dos processos. Até o momento, 184 mil solicitações foram avaliadas — dessas, 150 mil foram aprovadas e 34 mil rejeitadas.
A cada dia, cerca de 2 mil imigrantes estão sendo notificados sobre a rejeição e orientados a deixar o território português. O prazo para saída voluntária é de até 20 dias, conforme determina a legislação local.
Brasileiros lideram pedidos e aprovações
O Brasil é o país que mais apresenta pedidos de residência em Portugal. Dos 73 mil processos de cidadãos brasileiros avaliados, 68 mil foram aceitos. Isso representa uma taxa de aprovação de 92,7% e de rejeição de 7,3%.
Já no caso dos indianos, a taxa de rejeição foi significativamente maior: dos 28 mil pedidos analisados, 13 mil (46,6%) foram recusados. Bangladesh, Paquistão e Nepal também apresentaram percentuais elevados de indeferimento, com cerca de um em cada quatro pedidos negados.

Foto: Getty / BBC News Brasil
Crescimento migratório pressiona serviços e acirra tensões
O aumento expressivo no número de estrangeiros foi um dos temas centrais nas eleições parlamentares portuguesas de 2025, que resultaram no fortalecimento da direita radical. O país passou de cerca de 500 mil imigrantes há uma década para 1,5 milhão atualmente, o que representa cerca de 14% da população.
“O número de imigrantes estrangeiros em Portugal quadruplicou, assim como o número de estudantes estrangeiros nas escolas públicas, a demanda por cuidados básicos de saúde e o número de contribuintes estrangeiros para a segurança social”, afirmou o ministro da Presidência, Antonio Leitão Amaro, em entrevista coletiva.
O ministro afirmou que o país está passando pela “maior mudança demográfica da nossa história democrática”, e que as transformações são tanto quantitativas quanto qualitativas.
“Esta mudança quantitativa também foi acompanhada por uma transformação significativa na natureza [da migração]”, declarou. “Nossa história de imigração sempre foi marcada essencialmente por populações imigrantes provenientes de países que falavam a mesma língua, compartilhavam as mesmas tradições e raízes culturais, históricas, linguísticas e religiosas”, completou Leitão Amaro.
Avanço da extrema direita e xenofobia em alta
O aumento da presença de imigrantes de diferentes origens culturais tem gerado episódios de resistência e xenofobia em algumas regiões de Portugal. A preocupação com a segurança, o impacto nos serviços públicos e a perda de identidade cultural são argumentos frequentemente explorados por setores conservadores e nacionalistas.
Especialistas em migração apontam que a retórica anti-imigrante tende a se intensificar em períodos eleitorais e alertam para os riscos sociais do endurecimento das políticas de acolhimento. O cenário português se assemelha a movimentos observados em outras nações europeias, como Itália, Alemanha e França. (Fonte: BBC News Brasil)