Estudos não comprovam relação direta entre o medicamento e Alzheimer; especialistas alertam para riscos nutricionais e recomendam acompanhamento clínico
A possível ligação entre o omeprazol — um dos medicamentos mais prescritos no Brasil — e o desenvolvimento de demência ou Alzheimer tem sido alvo de debate desde 2014. Naquele ano, um estudo alemão publicado no periódico JAMA Neurology sugeriu uma associação entre o uso prolongado de inibidores de bomba de prótons (IBPs) e maior incidência de demência em idosos. Essa classe inclui, além do omeprazol, o pantoprazol e o esomeprazol.
Contudo, pesquisas posteriores, como a realizada na Finlândia em 2017 com mais de 250 mil pacientes e publicada na revista Neurology, não confirmaram essa relação. Segundo especialistas, os estudos iniciais eram observacionais e não estabeleciam vínculo de causa e efeito.
“Essas pessoas, por terem mais doenças associadas e usarem mais remédios, já têm um risco aumentado de declínio cognitivo. Isso não significa que o omeprazol seja o causador”, esclarece o neurologista Iago Navas, da Clínica Sartor.
Deficiência nutricional como fator indireto
Embora não haja evidência científica de que o omeprazol provoque demência, o uso contínuo pode interferir na absorção de nutrientes essenciais. O ácido gástrico é responsável por liberar a vitamina B12 dos alimentos, e sua supressão prolongada pode levar à deficiência dessa vitamina, além de ferro e magnésio. A carência de B12, por exemplo, está associada a sintomas como fadiga, lapsos de memória e dificuldade de concentração.
“É uma relação indireta: o remédio não causa o problema cognitivo, mas pode facilitar uma deficiência que interfere no metabolismo cerebral”, afirma Navas.
Revisões recentes publicadas no Journal of the American Geriatrics Society (2020) e no Frontiers in Pharmacology (2022) reforçam essa associação nutricional, especialmente entre idosos. A boa notícia é que a reposição vitamínica costuma reverter os sintomas.
Uso seguro depende de acompanhamento
A gastroenterologista Débora Poli, do Hospital Sírio-Libanês, alerta que os IBPs foram desenvolvidos para uso controlado e por tempo determinado. “É um medicamento importante, mas não inofensivo. Deve ser usado com indicação precisa e tempo determinado”, ressalta.
O uso prolongado também pode aumentar o risco de infecções intestinais e alterar a microbiota, embora esses efeitos não estejam diretamente ligados à cognição.
O oncologista Raphael Brandão, da Clínica First, reforça que a segurança do tratamento depende da forma como o medicamento é utilizado. “O objetivo é usar a menor dose, pelo menor tempo possível, e sempre com reavaliação médica”, orienta.
A cirurgiã Vanessa Prado, do Hospital Nove de Julho, lembra que há opções mais modernas de bloqueadores de prótons, com melhor perfil farmacológico e absorção.
Grupos que exigem maior cuidado
Idosos e pacientes em uso de múltiplos medicamentos são mais suscetíveis a deficiências nutricionais e interações. Por isso, o acompanhamento clínico deve incluir exames de vitamina B12, magnésio e densitometria óssea, conforme o histórico e tempo de uso.
“O foco não é o medo, e sim o acompanhamento”, resume Débora Poli. “Usar com indicação correta, por tempo determinado e sob supervisão médica é o que garante segurança.”
(Fonte: G1



