Compositor e multi-instrumentista alagoano revolucionou a música brasileira com experimentação e criatividade
Morreu neste sábado (13), aos 89 anos, o compositor, arranjador e multi-instrumentista Hermeto Pascoal, conhecido como o “bruxo dos sons”. A informação foi confirmada por meio das redes sociais do artista, em nota assinada por familiares e pela equipe, sem detalhar a causa da morte.
“Com serenidade e amor, comunicamos que Hermeto Pascoal fez sua passagem para o plano espiritual, cercado pela família e por companheiros de música. No exato momento da passagem, seu Grupo estava no palco, como ele gostaria, fazendo som e música”, diz o comunicado.
O músico deveria se apresentar no festival AcessaBH, em Belo Horizonte, neste sábado, mas sua participação foi cancelada horas antes.
Últimos anos e despedida
Nos últimos meses, Pascoal vinha cancelando apresentações devido ao estado de saúde fragilizado, embora detalhes sobre sua condição não tenham sido divulgados. A família informou que haverá uma cerimônia de despedida aberta ao público, com informações a serem divulgadas em breve.
“Como ele sempre nos ensinou, não deixemos a tristeza tomar conta, escutemos o vento, o canto dos pássaros, o copo d’água, a cachoeira, a música universal segue viva”, prossegue a nota. “Pedimos respeito e privacidade neste momento. Quem desejar homenageá-lo, deixe soar uma nota no instrumento, na voz, na chaleira e ofereça ao universo. É assim que ele gostaria.”
O “bruxo dos sons”
Hermeto Pascoal construiu uma obra marcada pela experimentação. Sons da natureza e do cotidiano — de chaleiras a cantos de pássaros — eram transformados em música. Essa ousadia o levou a ser considerado um dos artistas mais originais da música brasileira, difícil de ser enquadrado em um único gênero.
Nascido em Lagoa da Canoa (AL), em 1936, quando o município ainda integrava Arapiraca, Hermeto descobriu desde cedo a paixão pelos sons ao seu redor. Filho de sanfoneiro, começou a tocar aos 11 anos em festas locais, acompanhado pelo irmão. Nos anos 1950, a família mudou-se para Recife, onde iniciou carreira em rádios locais.
Foi em São Paulo, nos anos 1960, que consolidou sua trajetória, lançando discos como Conjunto Som 4 (1964) e Sambrasa Trio em Som Maior (1966). Em 1967, no 3º Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, participou com o Quarteto Novo, acompanhando Edu Lobo na canção Ponteio, vencedora da edição.
Reconhecimento internacional
Após turnê com Geraldo Vandré, Hermeto viajou aos Estados Unidos, onde trabalhou com Miles Davis e se projetou no cenário internacional. Seu primeiro LP, Hermeto, foi seguido por obras que se tornaram referência, como A Música Livre de Hermeto Pascoal, Slaves Mass, Ao Vivo em Montreux Jazz e Lagoa da Canoa, Município de Arapiraca.
Em sua discografia, também estão Festa dos Deuses, Eu e Eles e Pra Você, Ilza (2024), escrito em homenagem à esposa, Ilza, falecida em 2000 após 46 anos de casamento.
Recentemente, lançou a biografia Quebra Tudo! A Arte Livre de Hermeto Pascoal, que reforça sua imagem de artista capaz de transformar qualquer som em música.
“Já nasci música, não fiz nada que não tivesse música”, afirmou em entrevista à Folha, há pouco mais de um ano. “O que escrevo numa bacia de banheiro é tão importante quanto o que escrevo em qualquer papel, porque a música é sagrada.”
Legado
Viúvo, Hermeto deixa seis filhos — Jorge, Fabio, Flávia, Fátima, Fabiula e Flávio Pascoal, percussionista que seguiu os passos do pai.
Figura central da música brasileira, Hermeto Pascoal permanece como símbolo da criatividade sem fronteiras, capaz de transformar o ordinário em arte.