Presidente afirma que não vai se “humilhar” para conversar com Trump, critica interferência estrangeira no processo contra Bolsonaro e anuncia ações com Brics e União Europeia
Governo descarta retaliação, mas cobra diálogo
Com o aumento das tarifas americanas sobre produtos brasileiros para 50% a partir desta quarta-feira (6), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, em entrevista à agência Reuters, que não vê possibilidade de interlocução direta com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Lula descartou qualquer iniciativa de retaliação tarifária, mas reforçou que o Brasil seguirá buscando alternativas para mitigar os impactos econômicos da medida.
“Não vamos desistir das negociações, mesmo sem interlocução no momento”, declarou o presidente, citando os esforços do vice-presidente Geraldo Alckmin, do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e do chanceler Mauro Vieira. Apesar disso, Lula afirmou que não pretende ligar para Trump agora: “O dia que minha intuição disser que ele está disposto a conversar, eu ligo. Mas hoje ela diz que não. E eu não vou me humilhar”.
Impacto comercial e novas rotas de exportação
Embora o aumento das tarifas represente uma das maiores barreiras comerciais impostas pelos EUA ao Brasil, Lula minimizou os efeitos sobre a economia nacional. O comércio com os Estados Unidos responde hoje por apenas 12% da balança comercial brasileira, bem abaixo dos quase 30% representados pela China.
“Se os EUA não quiserem comprar, vamos vender para outro. Se a China não quiser, procuramos outro”, disse Lula, destacando a expansão da pauta comercial brasileira nas últimas décadas.
Relações bilaterais em tensão histórica
Para o presidente, o relacionamento entre Brasil e Estados Unidos atravessa seu pior momento em dois séculos. Lula reagiu com veemência ao fato de Trump ter vinculado o aumento das tarifas ao processo judicial contra Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF).
“O STF não se importa com o que Trump pensa e nem deve se importar”, afirmou. Ele ainda defendeu que Bolsonaro seja julgado por incitar a intervenção estrangeira no Brasil: “Isso é traição à pátria”.
Brasil prepara reação com Brics e União Europeia
Lula afirmou que pretende discutir o tema das tarifas com os demais membros do Brics, começando com contatos com os líderes da Índia e da China. Ele quer coordenar uma possível resposta conjunta às políticas unilaterais dos EUA.
“O que Trump quer é acabar com o multilateralismo. Ele prefere negociar país a país, impondo sua vontade”, disse Lula, criticando a postura isolacionista do republicano. Segundo o presidente brasileiro, o tema será abordado na presidência rotativa do Brics, atualmente ocupada pelo Brasil. “Vamos avaliar com cada país o impacto das tarifas e buscar uma posição comum”, disse.
Além do Brics, Lula também sinalizou que pretende avançar nas tratativas do acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia, que, segundo ele, conectará 722 milhões de consumidores. “Vamos fechar esse acordo antes do fim do ano”, prometeu.
Minérios estratégicos entram na agenda de soberania
Lula também anunciou que o governo criará uma política nacional voltada aos minerais estratégicos, com a instalação de um conselho nacional vinculado à Presidência da República. O objetivo é garantir que os recursos minerais brasileiros sejam tratados como tema de soberania nacional.
“Não vamos repetir o erro do século passado, quando exportávamos minério bruto e importávamos produtos com alto valor agregado”, afirmou. A nova política mira tornar o Brasil um protagonista na transição energética global, com foco no aproveitamento interno e estratégico de suas riquezas minerais.
Acusações de traição e novo processo contra os Bolsonaros
Durante a entrevista, Lula sugeriu que Jair Bolsonaro e seu filho Eduardo Bolsonaro devem ser responsabilizados judicialmente por estimularem uma interferência dos Estados Unidos na política interna brasileira.
“Bolsonaro e o filho foram aos EUA insuflar Trump contra o Brasil. Isso nunca aconteceu na história de outro país. É traição à pátria”, afirmou Lula. Eduardo Bolsonaro, deputado federal licenciado, mudou-se para os EUA no início do ano e buscou apoio de aliados de Trump para contestar os processos judiciais enfrentados por seu pai no Brasil.
A nova tarifa de 50% sobre produtos brasileiros anunciada pela Casa Branca veio logo após essas movimentações em Washington. Lula atribui o endurecimento das relações à articulação da família Bolsonaro com a extrema-direita americana.
Compensações econômicas e manutenção de empregos
O presidente afirmou que seu governo estuda medidas compensatórias para proteger empresas brasileiras afetadas pelas tarifas americanas. O foco, segundo ele, é garantir a manutenção dos empregos e a abertura de novos mercados para os produtos nacionais.
“Temos a obrigação de ajudar as empresas a se manterem e encontrarem novos compradores. E temos que convencer os empresários americanos a pressionarem o presidente Trump para flexibilizar essas decisões”, disse Lula, sem adiantar quais medidas serão adotadas.