Parlamentares concentram verba pública: Lira lidera com R$ 250 milhões; Pacheco segue com R$ 215 milhões
Alvos de um impasse entre o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF) em 2024, as emendas de comissão beneficiaram de forma expressiva os então presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Juntos, eles direcionaram R$ 460 milhões a seus estados de origem, concentrando a maior parte desses recursos na cúpula do Legislativo.
Lira foi o principal beneficiado, com R$ 250 milhões encaminhados a Alagoas — valor seis vezes superior ao teto das emendas individuais de deputados (R$ 37,5 milhões). Pacheco, por sua vez, teve apadrinhados R$ 215 milhões para Minas Gerais, o equivalente a três vezes o limite individual de senadores (R$ 69,3 milhões).
STF exigiu transparência após suspensão dos repasses
A destinação dos recursos foi temporariamente suspensa em agosto de 2024, por decisão do ministro Flávio Dino, do STF, que apontou a falta de transparência na identificação dos verdadeiros autores das emendas — até então atribuídas genericamente às comissões temáticas do Congresso.
A liberação dos valores só ocorreu após o Legislativo se comprometer com medidas de transparência, incluindo a divulgação dos nomes dos parlamentares responsáveis por cada indicação. A identificação foi formalizada na última semana, com a reinstalação das comissões da Câmara e do Senado e a ratificação das indicações feitas no ano anterior.
No caso de Pacheco, contudo, o cumprimento da exigência ocorreu de forma parcial. As atas das comissões não mencionam seu nome diretamente, uma vez que todas as emendas da bancada do PSD foram atribuídas ao líder do partido, senador Omar Aziz (AM). Questionado, Pacheco confirmou ter sido o responsável pelos repasses para Minas Gerais, argumentando que o estado concentra 15% dos municípios do país. Lira não se manifestou.
Lideranças partidárias concentram valores bilionários
A prática de líderes partidários assinarem como responsáveis pelas emendas também foi generalizada. Segundo levantamento do Globo, R$ 2,6 bilhões dos R$ 11,6 bilhões distribuídos via comissões estavam em nome de líderes das bancadas.
Essa estratégia resultou em novo atrito entre Congresso e Supremo. Em dezembro, o envio de ofícios ao governo com indicações genéricas em nome dos líderes foi interpretado como tentativa de burlar a decisão de Dino. A medida levou o STF a suspender novamente os pagamentos, a pedido do PSOL e do Novo. O ministro só autorizou a retomada após o Congresso aprovar um plano de trabalho para aumentar a transparência na execução dos recursos.
Lira travou disputa por controle de indicações
A distribuição dos recursos também gerou disputas internas no Congresso. Lira enfrentou resistência de presidentes de comissões temáticas, que alegaram não ter sido consultados sobre o envio dos ofícios com assinaturas dos líderes.
Um dos casos mais emblemáticos foi o do deputado José Rocha (União-BA), então presidente da Comissão de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional. Rocha relatou ter recebido os ofícios diretamente do gabinete de Lira, mas optou por não convocar reunião para ratificar os valores ao perceber a concentração de recursos em Alagoas.
As reuniões para ratificação das emendas só ocorreram neste ano, como parte do acordo com o STF. Mesmo assim, algumas sessões foram marcadas por protestos. A deputada Adriana Ventura (Novo-SP), da Comissão de Saúde, criticou a falta de transparência interna:
— Ninguém pegou a lista e olhou. Cada um dos líderes mandou com os nomes e valores e pronto. As comissões votaram às cegas. Muito líder partidário, para não contar aos deputados da sua bancada que um recebeu nada e o outro recebeu 50, outro 10, põe tudo no nome dele (do líder).
Disputa por comissões movimenta bastidores do Congresso
Com previsão de R$ 11,5 bilhões em emendas de comissão para 2025, a presidência das comissões se tornou foco de disputa entre partidos. O PL, dono da maior bancada da Câmara, assegurou o controle de comissões que concentram R$ 4,8 bilhões. O PSD, por sua vez, obteve a Comissão de Minas e Energia após acordo com o PL, que ficou com a Comissão de Agricultura.
O MDB garantiu R$ 2,5 bilhões, principalmente por meio da Comissão de Assuntos Sociais do Senado, presidida pelo senador Marcelo Castro (PI). O partido também comandará a Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara, com R$ 550 milhões em recursos.
Embora a presidência das comissões não assegure controle direto sobre a destinação final dos valores, cabe ao presidente enviar ao governo os ofícios com os repasses aprovados, o que dá peso político significativo ao cargo.