Premiê indiano convoca população a valorizar produtos nacionais e resiste à pressão dos EUA para romper laços com Moscou
Nova escalada entre Washington e Nova Délhi
O primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, reagiu com firmeza às ameaças comerciais do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, conclamando os indianos a priorizarem o consumo de bens produzidos no país e mantendo a postura de não interromper as compras de petróleo da Rússia. Segundo fontes ouvidas pela agência Bloomberg, que pediram anonimato devido à sensibilidade do tema, o governo indiano não emitiu qualquer orientação para que as refinarias suspendam as importações do combustível russo.
Tanto estatais quanto empresas privadas seguem autorizadas a adquirir petróleo dos fornecedores que oferecerem as melhores condições comerciais. A decisão de compra, segundo interlocutores do setor, permanece no âmbito empresarial, sem interferência direta do governo.
Resposta nacionalista diante de incertezas globais
Durante discurso no último sábado (2), em um comício no estado de Uttar Pradesh, Modi defendeu os interesses econômicos da Índia diante do cenário geopolítico instável. “A economia mundial enfrenta grandes incertezas — há uma atmosfera de instabilidade”, declarou. “Agora, qualquer coisa que compremos deve ter apenas um critério: que seja fruto do suor de um indiano.”
A manifestação ocorreu dias após a Casa Branca anunciar a imposição de uma tarifa de 25% sobre as exportações indianas aos Estados Unidos, gesto interpretado em Nova Délhi como uma retaliação ao alinhamento da Índia com a Rússia no contexto da guerra da Ucrânia.
Trump mira Índia em disputa com Putin
A Índia passou a ser um dos principais alvos da política externa de Trump, que busca isolar o presidente russo, Vladimir Putin, no cenário internacional. Em críticas contundentes na semana passada, Trump atacou a aproximação entre Índia e Rússia no âmbito dos BRICS. “Podem afundar juntos com suas economias mortas”, disparou o presidente norte-americano.
A retórica representa um rompimento com a abordagem anterior dos Estados Unidos, que por anos relevaram os laços históricos entre Nova Délhi e Moscou. Até então, Washington vinha incentivando uma aproximação estratégica com a Índia como forma de conter a influência da China na Ásia.
Acusações e tensões comerciais
Em entrevista no domingo, Stephen Miller, vice-chefe de gabinete de Trump, acusou a Índia de aplicar tarifas elevadas sobre produtos americanos e de explorar o sistema migratório dos EUA, além de manter volume expressivo de compras de petróleo russo — em patamares próximos aos da China.
O próprio Trump afirmou recentemente à imprensa que teria recebido informações de que a Índia estaria prestes a interromper as importações de petróleo da Rússia. “Seria um bom passo”, comentou.
No entanto, reportagem do New York Times, publicada no sábado, afirma que o governo indiano decidiu manter as compras, mesmo diante das ameaças de sanções por parte dos Estados Unidos. A informação foi atribuída a dois altos funcionários indianos que não quiseram se identificar.
Importações com desconto e crítica ocidental
Durante o conflito na Ucrânia, as refinarias indianas passaram a exercer papel relevante no mercado de petróleo russo, aproveitando os preços com desconto para ampliar as importações. Hoje, a Índia é o maior comprador mundial de petróleo bruto marítimo vindo da Rússia, responsável por cerca de um terço de todas as importações indianas do produto.
Apesar de a China permanecer como o principal aliado estratégico de Moscou, a margem de influência de Washington sobre o país asiático é limitada. Isso se deve, em parte, à dependência dos Estados Unidos das exportações chinesas de terras raras, insumos essenciais para a indústria de alta tecnologia.
Parceria histórica com Moscou
Em meio à crescente pressão internacional, o governo indiano tem reiterado seu compromisso com a cooperação bilateral com a Rússia. Em coletiva de imprensa na sexta-feira (1º), o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Índia, Randhir Jaiswal, afirmou que os laços entre os dois países constituem uma “parceria estável e comprovada pelo tempo”, firmada desde a Guerra Fria e reforçada por décadas de cooperação em defesa e energia.