Novo modelo de consignado pode impulsionar financiamento imobiliário e reduzir saques do FGTS
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou nesta quarta-feira (29) que o e-Social será utilizado como base para a concessão de crédito consignado a trabalhadores do regime CLT e a empregados domésticos registrados na plataforma. A iniciativa faz parte de um novo modelo de financiamento que busca ampliar o acesso ao crédito.
O anúncio ocorreu após uma reunião entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os dirigentes dos principais bancos do país, no mesmo dia em que o Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu elevar a taxa Selic em um ponto percentual. A retração do crédito, agravada pelo cenário de juros elevados, tem sido uma das preocupações do governo.
Expansão do consignado e projeções do mercado
Os bancos estimam que o novo modelo de consignado privado pode aumentar em até R$ 80 bilhões o volume de empréstimos nessa modalidade, alcançando R$ 120 bilhões. Atualmente, o saldo do crédito consignado no setor privado gira em torno de R$ 40 bilhões, e algumas instituições financeiras preveem que esse montante pode até quadruplicar.
Apesar do otimismo do setor, os representantes dos bancos destacaram que o sucesso da medida depende da ausência de um teto para os juros. Segundo fontes que acompanharam a reunião, os executivos argumentaram que, em um cenário de inflação e juros elevados, a definição de um limite para as taxas poderia comprometer a adesão ao novo modelo.
Impasses e debate sobre o FGTS
Dois fatores ainda impedem a implementação imediata do novo consignado. O primeiro é a indefinição sobre a regulamentação dos juros. O segundo envolve a posição do ministro do Trabalho, Luiz Marinho, que defende o fim do saque-aniversário do FGTS antes da criação do crédito consignado privado.
Embora o governo tenha evitado detalhar o uso do FGTS como garantia para essa nova modalidade de crédito, uma lei de 2023 já permite que o trabalhador ofereça até 10% do saldo do fundo como garantia para o consignado. Marinho afirmou que essa regra será mantida, mas os bancos defendem que uma nova regulamentação seja debatida.
Como funcionará o novo modelo?
Atualmente, o crédito consignado privado depende de convênios entre empresas e instituições financeiras, o que restringe sua adesão. O novo modelo pretende superar essa limitação ao criar uma plataforma baseada no e-Social, permitindo que trabalhadores comparem ofertas de diferentes bancos e realizem a contratação diretamente.
“Esse modelo representa uma revolução no crédito brasileiro, pois a consignação será feita diretamente no e-Social, plataforma já obrigatória para empresas que recolhem tributos e contribuições previdenciárias”, explicou Haddad.
O ministro destacou que a medida visa facilitar o acesso ao crédito consignado para milhões de brasileiros que atualmente não têm essa opção. Além disso, a nova plataforma digital conectará empresas de todos os portes aos bancos participantes, promovendo maior concorrência no setor.
Impacto no mercado imobiliário
A criação do consignado vinculado ao e-Social tem sido vista pelo mercado imobiliário como uma alternativa ao saque do FGTS. O governo apresentou a medida como uma promessa ao setor na última terça-feira (28), em um esforço para preservar a capacidade do fundo de financiar habitação popular sem restringir o acesso dos trabalhadores a crédito com taxas mais competitivas.
A Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) avalia que, se bem estruturado, o novo modelo poderá equilibrar o uso do FGTS, evitando que os saques comprometam investimentos em moradias. Desde a criação do saque-aniversário, em 2019, mais de R$ 121 bilhões foram retirados do fundo, volume que, segundo o setor, poderia ter viabilizado a construção de cerca de 600 mil novas habitações e a geração de 1,5 milhão de empregos.
Dados de julho de 2024 indicam que, mesmo com os saques, o saldo do FGTS cresceu 40% desde 2020.
Próximos passos
Haddad afirmou que o texto da medida – que deve ser apresentada ao Congresso por meio de uma medida provisória – ainda passará por ajustes finais em reunião com o presidente Lula. A expectativa é que a regulamentação do novo modelo seja publicada nos próximos meses, permitindo que os trabalhadores tenham acesso a uma linha de crédito mais acessível.
O presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, destacou que o modelo deve estimular a concorrência entre os bancos, permitindo que os trabalhadores migrem entre diferentes instituições financeiras para obter melhores condições.
“Quanto maior a concorrência entre os bancos, melhor para o trabalhador, que poderá escolher as taxas mais vantajosas. Defendemos que não haja um teto para os juros, pois isso pode distorcer a competição”, afirmou Sidney.
A implementação do novo consignado será acompanhada por representantes do governo e do setor financeiro, e os ajustes finais deverão definir se ele coexistirá com o modelo atual ou se irá substituí-lo integralmente.