Casa Branca pode adotar regra da década de 1930 para sustentar tarifas; alimentos e commodities agrícolas podem ficar isentos
Pressão aumenta às vésperas da taxação
A dois dias da entrada em vigor da tarifa de 50% sobre produtos importados do Brasil, empresários e analistas acompanham com apreensão os desdobramentos em Washington. Apesar de o governo Trump sinalizar uma possível isenção para alimentos e matérias-primas que os Estados Unidos não produzem internamente, como café e cacau, cresce a expectativa de que uma nova base legal seja adotada para justificar a medida.
A Seção 338 da Lei de Comércio de 1930, até hoje nunca utilizada por um presidente norte-americano, passou a ser apontada por especialistas como a provável justificativa jurídica do tarifaço. Conforme antecipado pela Bloomberg, a Casa Branca tem buscado alternativas legais que contornem as fragilidades do argumento inicial baseado na legislação de emergência nacional.
Seção 338: um instrumento esquecido da era Roosevelt
A Seção 338 autoriza o presidente dos EUA a impor tarifas adicionais de até 50% sobre produtos oriundos de países considerados discriminatórios nas relações comerciais. A regra prevê a entrada em vigor das tarifas 30 dias após o anúncio oficial. Documentos de grandes bancas jurídicas americanas resgataram registros de uso indireto do dispositivo durante o período entre sua criação, em 1930, e a Segunda Guerra Mundial, quando foi mencionado como instrumento de barganha pelo presidente Franklin D. Roosevelt frente a França, Alemanha e Japão.
A norma permite reação americana a práticas comerciais vistas como desleais, inclusive barreiras alfandegárias, exigências técnicas desproporcionais ou taxas portuárias excessivas — desde que não sejam aplicadas de forma equivalente a outros países.
Manobra tenta contornar bloqueios judiciais à Ieepa
A eventual adoção da Seção 338 ocorre em meio a obstáculos enfrentados pelo governo Trump para justificar as tarifas com base na Lei de Poderes Econômicos Internacionais de Emergência Nacional (Ieepa), de 1977. Argumentando que essa legislação não autoriza taxações tarifárias sem aval do Congresso, grupos empresariais americanos e procuradores de 12 estados ajuizaram ações na Justiça.
Em maio, uma decisão liminar suspendeu os efeitos do tarifaço anunciado no início de abril. Apesar de o governo ter recorrido e mantido a medida ativa, a controvérsia jurídica estimulou a busca por alternativas mais robustas, como a Seção 338.
Transações com o Brasil geram superávit para os EUA
Outro argumento contestado é o de que o Brasil teria adotado práticas comerciais lesivas aos interesses americanos. Na prática, o comércio bilateral tem sido favorável aos Estados Unidos, com sucessivos superávits na balança.
Ainda assim, a administração Trump já utilizou diferentes instrumentos legais para justificar medidas protecionistas. A Seção 232 da Lei de Expansão Comercial dos EUA foi acionada para tarifar o aço e o alumínio, enquanto a Seção 301 da Lei de Comércio de 1974 embasou sanções contra países que penalizam grandes empresas de tecnologia americanas.
Possível isenção para alimentos e insumos naturais
Em meio à pressão, o secretário de Comércio dos EUA, Howard Lutnick, admitiu que produtos essenciais não fabricados nos EUA podem ser poupados das tarifas, o que inclui alimentos e matérias-primas agrícolas. A sinalização, porém, não é suficiente para acalmar os setores exportadores brasileiros, especialmente diante da expectativa de que Trump assine um novo decreto com base na Seção 338 ainda nesta quarta-feira.