Discípulo de Chico Xavier, ele difundiu a doutrina espírita em mais de 70 países e dedicou a vida à assistência social e espiritual
O médium e educador Divaldo Franco morreu nesta terça-feira (13), aos 98 anos. Considerado um dos maiores nomes do espiritismo no Brasil, Franco foi responsável por disseminar a doutrina em diversos países, além de fundar uma das mais relevantes instituições filantrópicas do país, a Mansão do Caminho, em Salvador. A causa da morte não foi divulgada. Nos últimos anos, ele enfrentava problemas de saúde, incluindo um câncer de bexiga diagnosticado em novembro de 2024.
De Feira de Santana para o mundo
Divaldo Pereira Franco nasceu em maio de 1927, na cidade de Feira de Santana (BA), a cerca de 100 km de Salvador. Caçula de uma família com 12 irmãos, formou-se professor primário em 1943, mas nunca exerceu a profissão. Dois anos depois, mudou-se para a capital baiana e iniciou carreira como servidor público no Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores do Estado, onde permaneceu até a aposentadoria, em 1980.
Criado em uma família católica, relatava que desde a infância via e ouvia espíritos. Na juventude, reconheceu-se médium e passou a desenvolver a psicografia — prática de transcrever mensagens atribuídas a espíritos desencarnados, conforme os princípios da doutrina espírita.
Fundação da Mansão do Caminho
Sua atuação religiosa começou em 1947, ao lado do amigo Nilson de Souza Pereira, com a criação do Centro Espírita Caminho da Redenção, em Salvador. O local viria a dar origem à Mansão do Caminho, fundada oficialmente em 1952, voltada ao acolhimento de crianças e adolescentes em situação de risco. O projeto social cresceu ao longo das décadas, transformando-se em uma referência nacional.
Atualmente, a instituição ocupa uma área de 78 mil metros quadrados no bairro de Pau da Lima, periferia da capital baiana. Oferece educação básica, assistência médica e serviços sociais a milhares de pessoas em situação de vulnerabilidade.
Difusor do espiritismo e sucessor de Chico Xavier
Divaldo Franco é reconhecido como um dos principais difusores do espiritismo no Brasil, ao lado de Chico Xavier (1910–2002), de quem herdou informalmente o papel de liderança doutrinária. Ao longo da vida, proferiu mais de 12 mil palestras em cerca de 2 mil cidades brasileiras e visitou mais de 60 países.
Sua produção literária ultrapassa 200 títulos, a maioria atribuída à psicografia sob orientação do espírito Joanna de Ângelis. Os livros já venderam mais de 7 milhões de exemplares e foram traduzidos para diversos idiomas. A chamada “Série Psicológica”, composta por 16 volumes, é destaque entre as obras por integrar conceitos espíritas e abordagens da psicologia moderna.
Joanna de Ângelis, segundo ele, seria um espírito que teria reencarnado em figuras históricas como Santa Clara de Assis, Joana de Cusa e Joanna Angélica — esta última, heroína da Independência do Brasil na Bahia.
Trabalho social e legado
Mais do que líder religioso, Divaldo Franco se destacou pela atuação humanitária. Ao longo da vida, acolheu como filhos cerca de 600 crianças em situação de abandono que passaram pela Mansão do Caminho. A estrutura da entidade inclui creche, escolas de ensino fundamental e médio, clínica de partos humanizados, centro médico e programas de apoio a idosos, gestantes e pacientes com doenças graves.
O Centro de Saúde Dr. José Carneiro de Campos, vinculado à instituição, oferece exames e consultas em diversas especialidades. Cerca de 2 mil crianças e adolescentes são atendidos diariamente.
Controvérsias e cinema
Em 2023, Divaldo Franco gerou controvérsia ao defender, em vídeo, os manifestantes envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro. À época, criticou as prisões feitas sem julgamento, o que provocou reações dentro do próprio movimento espírita, especialmente entre os setores mais progressistas.
Sua trajetória de vida foi retratada no cinema no filme “Divaldo – O Mensageiro da Paz”, lançado em 2019, sob direção de Clovis Mello e com atuações de Guilherme Lobo, Regiane Alves, Bruno Garcia e Marcos Veras. Em entrevista à Folha de S.Paulo, o médium declarou que havia solicitado a retirada de trechos pró-espiritismo do roteiro: “Para mim é muito mais importante ser um cidadão ateu do que um cristão sem dignidade”, afirmou na ocasião.