Pesquisas começam a revelar os perigos dos vapes, que, apesar de prometerem ser uma alternativa ao cigarro, podem causar danos significativos à saúde
Quando os cigarros eletrônicos começaram a ganhar popularidade, no início da década de 2010, foram rapidamente apresentados como uma opção mais saudável para os fumantes e uma possível ferramenta para parar de fumar. No entanto, à medida que mais estudos são conduzidos, as evidências sobre os riscos dos vapes começam a se intensificar. Pesquisadores têm encontrado níveis alarmantes de substâncias tóxicas nos líquidos utilizados nesses dispositivos, revelando uma nova perspectiva sobre os perigos à saúde que antes eram subestimados.
Descobertas preocupantes sobre os vapes
Um estudo recente, realizado nos Estados Unidos, detectou quantidades significativas de metais pesados na névoa dos cigarros eletrônicos populares, chegando a surpreender até mesmo os próprios cientistas, que inicialmente suspeitaram de um defeito na máquina. Outros trabalhos sugerem que o uso de vapes pode afetar negativamente o coração, os pulmões e o cérebro, mas como os cigarros eletrônicos são relativamente novos e estão em constante evolução, os efeitos a longo prazo ainda são desconhecidos. Muitos dos usuários desses dispositivos são adolescentes ou jovens adultos, o que significa que os impactos na saúde podem levar anos para se manifestar.
O professor de Medicina Cardiovascular da Universidade de Wisconsin, James H. Stein, alerta que, de acordo com o bom senso, inalar substâncias químicas superaquecidas nos pulmões não pode ser benéfico à saúde.
Impactos no sistema cardiovascular
O uso de cigarros eletrônicos causa estresse imediato no sistema cardiovascular. Ao inalar, a frequência cardíaca aumenta e os vasos sanguíneos se contraem, o que pode levar ao enrijecimento das artérias com o tempo. Stein observa que o uso contínuo desses dispositivos pode resultar em um efeito similar à hipertensão, elevando o risco de doenças graves, como arritmias cardíacas, acidente vascular cerebral (AVC) e infarto do miocárdio.
Os líquidos dos vapes, quando aquecidos, podem liberar substâncias nocivas, como formaldeído e acetaldeído, conhecidos por seus efeitos carcinogênicos. Esses compostos não só danificam os vasos sanguíneos, mas também aumentam a inflamação, fator de risco para doenças cardiovasculares.
Além disso, a retirada da nicotina pode causar sintomas de abstinência, como aumento da frequência cardíaca e pressão arterial, o que agrava ainda mais os efeitos negativos no sistema cardiovascular.
Danos aos pulmões e riscos respiratórios
Os efeitos adversos nos pulmões também são uma preocupação crescente. O uso contínuo de vapes causa inflamação nas vias respiratórias, que pode se tornar crônica, agravando condições como asma e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), além de causar tosse persistente e falta de ar. Embora ainda não se saiba se os cigarros eletrônicos causam câncer, eles expõem os usuários a substâncias que, em longo prazo, podem aumentar o risco de desenvolvimento da doença.
Pesquisas conduzidas pelo professor Brett Poulin, da Universidade da Califórnia, testaram várias marcas de vapes e encontraram níveis elevados de metais pesados, como níquel, antimônio e chumbo, substâncias associadas a câncer de pulmão e distúrbios neurológicos. Esses achados indicam que os riscos respiratórios e cardiovasculares dos vapes são substanciais e não devem ser subestimados.
Além disso, compostos presentes nos vapes, como o diacetil, usado em alguns líquidos saborizados, podem causar lesões pulmonares graves, com o conhecido “pulmão de pipoca”, uma condição irreversível. Em 2019, um surto de lesões pulmonares graves associadas ao acetato de vitamina E resultou em 68 mortes nos Estados Unidos.
Efeitos na saúde bucal e dependência
Semelhante aos cigarros tradicionais, o uso de vapes também prejudica a saúde bucal. A nicotina reduz o fluxo sanguíneo para as gengivas, tornando-as mais suscetíveis a doenças e infecções. Além disso, o uso contínuo de nicotina pode prejudicar os tecidos gengivais, comprometendo a saúde oral dos usuários.
O vício é outra grande preocupação, principalmente entre os jovens. Estudos revelam que os cigarros eletrônicos são altamente viciantes, e a dependência de nicotina pode ser particularmente prejudicial para os adolescentes, cujo cérebro ainda está em desenvolvimento. A abstinência pode causar sintomas como depressão, ansiedade e irritabilidade, tornando o processo de cessação ainda mais difícil.
Especialistas também apontam que novos dispositivos, com níveis mais altos de nicotina, estão sendo introduzidos no mercado, aumentando o risco de dependência. Um estudo revelou que modelos de vapes agora oferecem até 20 mil tragadas de nicotina, o que equivale a 100 maços de cigarro.
O cenário no Brasil
Embora os cigarros eletrônicos ainda não sejam tão comuns no Brasil, com apenas 5,4% da população adulta utilizando os dispositivos, a situação entre os adolescentes é preocupante. O terceiro Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (LENAD III) revelou que 8,7% dos jovens entre 14 e 17 anos usaram vapes no último ano, cinco vezes mais do que os que consumiram cigarro convencional.
Adicionalmente, 1,9% da população brasileira acima de 14 anos faz uso simultâneo de cigarro convencional e vape, o que dificulta a análise isolada dos danos causados pelos dispositivos eletrônicos.
No Brasil, os cigarros eletrônicos são ilegais desde 2009, com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) proibindo sua fabricação e venda. A proibição foi reavaliada em 2024 e mantida, o que significa que todos os dispositivos encontrados no país são provenientes do contrabando.
Conclusão
Embora os cigarros eletrônicos não contenham todos os produtos químicos nocivos presentes nos cigarros convencionais, eles apresentam seus próprios riscos significativos à saúde. O uso de vapes, especialmente entre os jovens, está associado a problemas respiratórios, cardiovasculares, dependência de nicotina e danos à saúde bucal. À medida que mais pesquisas são realizadas, fica cada vez mais claro que os vapes não são uma solução segura para os problemas do tabagismo, mas sim uma nova ameaça à saúde pública.