Primeiro encontro presencial entre chanceler Mauro Vieira e representantes americanos mira etanol, minerais críticos e big techs
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) definiu um roteiro sobre o que pode ser sinalizado aos Estados Unidos na mesa de negociações a respeito das tarifas aplicadas ao Brasil.
A primeira reunião presencial entre o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, e o representante comercial dos EUA, Jamieson Greer, ocorre nesta quinta-feira (16). O encontro é o primeiro desse tipo desde a conversa entre Lula e Donald Trump.
Integrantes do governo brasileiro adotam cautela e ressaltam que o encontro não deve ser considerado definitivo. A estratégia inicial será ouvir as demandas americanas, mas o time brasileiro já elaborou sugestões em três frentes de interesse dos EUA: etanol, minerais críticos e big techs. Entre os objetivos está a redução das tarifas de 50% aplicadas pelo país norte-americano, além do fim de sanções, como suspensão de vistos e penalidades financeiras contra autoridades brasileiras.
Pressão política e enfoque comercial
Dois integrantes da administração americana informaram à Folha que a política externa de Trump em relação ao Brasil permanece inalterada. O governo manterá a pressão sobre o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em função de decisões relacionadas às big techs e ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Jamieson Greer chegou a vincular as tarifas a preocupações com censura e Estado de Direito, mas o governo brasileiro optou por não reagir e aguardar a reunião. Outro aliado de Trump mencionou a situação de saúde de Bolsonaro, mas o governo Lula reforçou que o foco das negociações será estritamente comercial.
A expectativa é que a argumentação americana seja repetida no encontro, mas o governo brasileiro pretende direcionar a conversa para gestos práticos nas áreas de interesse dos EUA.
Etanol e indústria sensível
No setor de etanol, o governo considera retomar o regime de cotas ou criar mecanismos para que o etanol americano entre por portos brasileiros no Sudeste. A medida preocupa produtores e políticos, especialmente no Nordeste, onde as usinas são menos mecanizadas e menos competitivas. O tema tem grande sensibilidade política e mobiliza parlamentares nordestinos no Congresso.
Minerais críticos e parceria estratégica
Quanto aos minerais críticos, o Brasil visa desenvolver a indústria nacional para a exploração desses recursos. Uma proposta em estudo prevê uma parceria de investimento com os EUA, na qual o país ajudaria a financiar a exploração em troca de garantia de cota de compra.
Big techs e regulação
No segmento de big techs, a atuação é limitada, pois as discussões se concentram no Congresso e no STF. Ainda assim, há possibilidade de tratar da regulação das empresas pela Anatel e da criação de grupos de trabalho que elaborem propostas específicas para esses temas.
Clima de confiança entre os governos
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou ter conversado com Mauro Vieira na véspera da reunião e destacou que o chanceler brasileiro demonstrou “bastante confiança” no restabelecimento do diálogo entre os dois governos.
“Não sei o caminho que temos pela frente ainda, mas acredito que esteja aberta uma avenida para restabelecermos relações cordiais, isolando a questão política da econômica”, disse Haddad. “A coisa mais grave que aconteceu foi a mistura entre política e economia.”
Na quarta-feira (15), o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e aliados também se reuniram em Washington no Departamento de Estado, no Departamento do Tesouro e na Casa Branca.
O empresário Paulo Figueiredo comentou à Folha que ficou satisfeito com as conversas. “Fomos bem recebidos como sempre. Não vimos nenhum indicativo de mudança da política externa americana. As conversas são naturais e podem ser muito benéficas para nossos objetivos”, afirmou.