Natural de Sertãozinho, no interior paulista, dom Ilson ocupa desde 2020 o cargo de vice-camerlengo da Igreja, posição estratégica em momentos de vacância papal, seja por falecimento, renúncia ou impedimento temporário do pontífice.
Figura pouco conhecida fora dos círculos internos da Igreja Católica, o arcebispo brasileiro Ilson de Jesus Montanari, de 65 anos, será um dos protagonistas nos bastidores do Vaticano durante o período de transição provocado pela morte do papa Francisco, ocorrida aos 88 anos, vítima de um acidente vascular cerebral.
Como segundo na hierarquia da Câmara Apostólica, órgão responsável pela administração financeira e patrimonial da Santa Sé, cabe a ele, em conjunto com o camerlengo titular, zelar pelo funcionamento do Vaticano até a escolha do próximo papa.
No atual cenário, o cargo de camerlengo é ocupado pelo cardeal irlandês Kevin Joseph Farrell, nomeado por Francisco em 2019. Após o falecimento do pontífice, dom Ilson participou dos procedimentos protocolares, como a constatação formal da morte e o lacre dos aposentos papais, etapas já concluídas.
Discreto e reservado, dom Ilson terá papel determinante nos ritos de despedida de Francisco, incluindo o funeral, e será figura-chave no conclave, a reunião de cardeais que elegerá o novo líder da Igreja Católica. Como secretário do conclave, caberá a ele redigir as atas das sessões, função que exige absoluto sigilo. Segundo o padre e teólogo Gilberto Kasper, de 68 anos, amigo de longa data de dom Ilson, “ele é o secretário do conclave, fez um juramento, e tudo que passa por suas mãos deve ser mantido em rigoroso sigilo. Se algo escapar, ele será destituído”.
Antes de assumir funções de destaque na Cúria Romana, dom Ilson teve uma trajetória marcada por simplicidade. Trabalhou como bancário em Ribeirão Preto, no período noturno, enquanto cursava filosofia pela manhã. Sua ordenação sacerdotal ocorreu em 1989, na paróquia São João Batista, em Sertãozinho, templo que ajudou a construir com apoio das irmãs canossianas. “Ele foi responsável tanto pela parte estrutural quanto pastoral. Ali que ele se tornou padre”, recorda Kasper.
Dom Ilson formou-se também em direito, economia e teologia, esta última cursada na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma. Em 2008, ingressou no serviço diplomático da Santa Sé como oficial da Congregação para os Bispos, órgão que assessora o papa em nomeações episcopais, reorganizações diocesanas e visitas de bispos ao Vaticano. Seu trabalho técnico e discreto foi reconhecido em 2013, quando Francisco o nomeou secretário da Congregação para os Bispos.
Na cerimônia de ordenação episcopal, em novembro daquele ano, dom Ilson escolheu como lema “Enraizado e fundamentado em Cristo”, reafirmando seu compromisso pastoral, de acordo com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Na ocasião, declarou: “Rezem por mim para que eu não seja pastor que dispersa e afugenta, mas que, no meu coração, Deus possa escavar lugares para acolher e cuidar de todos, principalmente dos mais feridos”.
Kasper, que conheceu dom Ilson ainda nos anos 1980, destaca suas qualidades de liderança e zelo administrativo: “Dom Ilson foi um grande líder desde muito jovem”. Apesar do perfil reservado, o arcebispo mantém uma relação próxima com colegas e amigos. “Quando eu relutava em estudar na Alemanha, ele foi até Bogotá só para me convencer. Graças a ele, eu fui e valeu a pena”, conta o teólogo.
A atuação de dom Ilson nos bastidores do Vaticano já o colocou entre os nomes cogitados para futuras promoções. “Logo, logo vamos ter um cardeal em Sertãozinho. Se ele não fosse uma pessoa fantástica, não cairia nas graças do papa Francisco”, aposta Kasper.
Durante o conclave, Montanari será responsável por redigir e preservar os registros do processo, reforçando seu papel essencial neste momento decisivo para a Igreja Católica.