Os distúrbios na comunicação verbal podem ser indicativos precoces de deterioração cognitiva. É essencial estar atento a esses sinais, pois podem ser um alerta para possíveis problemas de saúde mental.
Estudos recentes têm mostrado que mudanças sutis na linguagem podem representar um dos primeiros sinais da doença de Alzheimer, mesmo antes de alterações evidentes na memória ou no comportamento. Segundo neurologistas, a identificação desses indícios pode ajudar no diagnóstico precoce, fator considerado crucial para retardar a progressão da doença.
Entre os sintomas mais comuns estão a dificuldade para encontrar palavras, a repetição frequente de ideias e a formação de frases desconexas. Em um artigo publicado na revista Neuron, pesquisadores da Universidade da Califórnia identificaram padrões de linguagem alterados em pacientes com Alzheimer leve, comparando amostras de fala com inteligência artificial treinada para detectar desvios linguísticos.
Mudanças sutis, mas significativas
“Essas alterações podem parecer inofensivas, como esquecer o nome de um objeto ou usar palavras vagas com mais frequência, mas são indicadores de que o cérebro já está sofrendo alterações”, afirma a neurologista Silvia Almeida, do Hospital das Clínicas da USP. Ela explica que o Alzheimer compromete regiões cerebrais ligadas à linguagem, como o lobo temporal, ainda nos estágios iniciais da doença.
Além da dificuldade para nomear objetos — sintoma conhecido como anomia —, outros sinais que merecem atenção incluem:
- Repetição de histórias ou perguntas, mesmo em um curto intervalo de tempo;
- Erros gramaticais frequentes e frases sem coesão;
- Vocabulário empobrecido, com uso recorrente de palavras genéricas;
- Desorganização no discurso, dificultando o acompanhamento de conversas.
Diagnóstico e cuidados
Estima-se que cerca de 1,2 milhão de brasileiros convivam com a doença de Alzheimer, de acordo com dados da Associação Brasileira de Alzheimer (Abraz). Desse total, ao menos 80% são diagnosticados em estágios moderados ou avançados, quando os danos cognitivos já são mais severos e o impacto sobre a vida cotidiana é maior.
Para Silvia Almeida, o diagnóstico precoce permite uma atuação mais eficaz. “Há medicamentos que ajudam a retardar o avanço da doença, e intervenções não farmacológicas, como terapia da fala, estimulação cognitiva e mudanças no estilo de vida, fazem bastante diferença”, afirma.
A fonoaudióloga Mariana Costa, especialista em reabilitação cognitiva, reforça a importância da escuta atenta. “Muitas vezes, os familiares percebem essas mudanças, mas demoram para procurar ajuda, acreditando que se trata apenas do envelhecimento natural. Isso atrasa a intervenção”, diz.
Inteligência artificial no auxílio ao diagnóstico
A tecnologia tem desempenhado um papel crescente no apoio ao diagnóstico de demências. Softwares capazes de analisar padrões de fala em entrevistas e conversas informais estão sendo testados em centros de pesquisa nos Estados Unidos e na Europa.
Um estudo conduzido pelo MIT, publicado no Journal of Alzheimer’s Disease, mostrou que algoritmos de processamento de linguagem natural conseguiram identificar, com 75% de acurácia, pacientes com Alzheimer leve a partir de gravações de voz.
“É uma ferramenta promissora, principalmente em países com acesso limitado a especialistas”, avalia Mariana Costa. “Mas nada substitui a avaliação clínica detalhada.”
Quando buscar ajuda
Caso uma pessoa comece a apresentar os sintomas descritos — sobretudo se acompanhados de lapsos de memória e alterações de comportamento —, o ideal é procurar um neurologista ou geriatra. O diagnóstico precoce permite melhor planejamento de cuidados e qualidade de vida para o paciente e sua família.