Meta fiscal é de equilíbrio, mas admite déficit de até R$ 31 bilhões; mercado reage à entrevista de Haddad
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou, nesta quarta-feira (22), o congelamento de R$ 31,3 bilhões no Orçamento de 2025. A medida consta no Relatório Bimestral de Receitas e Despesas, documento que atualiza as projeções fiscais da União. Além do bloqueio, está previsto um aumento no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), embora os detalhes ainda não tenham sido divulgados.
A decisão ocorre em um contexto de tentativa de cumprimento da meta fiscal para o ano, que prevê resultado primário zero – isto é, equilíbrio entre receitas e despesas –, com tolerância para déficit ou superávit de até R$ 31 bilhões, o equivalente a 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB).
Mercado oscila após fala de ministros
Logo após os primeiros relatos sobre o bloqueio de recursos, o dólar comercial passou a operar em queda expressiva. Às 14h30, a moeda norte-americana recuava 0,70%, cotada a R$ 5,59. Os juros futuros, que vinham em alta, se estabilizaram, e o Ibovespa operava com valorização de 0,5%.
Para Gustavo Okuyama, gestor de renda fixa da Porto Asset, a magnitude do bloqueio surpreendeu positivamente o mercado. “O congelamento na casa de R$ 30 bilhões, bem superior à expectativa do mercado, fez os ativos locais ampliarem a performance do dia, com o real conseguindo operar abaixo dos R$ 5,60 e os juros futuros cedendo de forma relevante”, afirmou.
A tendência, contudo, foi revertida após a entrevista coletiva dos ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento). Com a piora nas projeções para o resultado das contas públicas, o dólar passou a subir e foi negociado a R$ 5,65 por volta das 16h, alta de 0,2%. O Ibovespa caiu 0,33%, aos 137.421 pontos.
Governo promete detalhar IOF após fechamento dos mercados
Durante a entrevista, o ministro Haddad informou que o detalhamento do aumento do IOF será feito apenas após o encerramento do pregão, às 17h. Ele criticou vazamentos e especulações no mercado e negou que haverá aumento do IOF sobre dividendos e transações financeiras.
“Nós fizemos questão de ser muito transparentes em relação à execução para que houvesse também, por parte do Congresso, do Judiciário, aquela harmonia que nós precisamos para tocar essa agenda à frente. Estamos em um ano não eleitoral e temos que aproveitar esse ano para levar ao Congresso nossas preocupações”, disse o ministro.
Segundo Haddad, o Orçamento está integralmente acessível. “A caixa-preta do orçamento está 100% aberta. Todo mundo vai poder fazer conta de quem está levando parte do orçamento, se é justo ou não”, completou.
Composição do bloqueio
O bloqueio de R$ 31,3 bilhões será dividido em duas frentes:
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Contingenciamento de R$ 20,7 bilhões: resultado da frustração de receitas; pode ser revertido se houver incremento na arrecadação.
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Bloqueio de R$ 10,6 bilhões: decorre do aumento de despesas obrigatórias, como aposentadorias e benefícios sociais; de difícil reversão.
O detalhamento por órgão será oficializado em decreto previsto para o próximo dia 30. Cada pasta terá até cinco dias úteis para indicar quais programações serão suspensas.
De acordo com o governo, o aumento nas despesas se deu principalmente pelo crescimento de R$ 15,6 bilhões nos gastos com benefícios previdenciários, R$ 4,5 bilhões no Plano Safra e R$ 2,8 bilhões no Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Planejamento e Previdência no centro da tensão
O ministro Haddad destacou a Previdência Social como um dos principais desafios fiscais. “O que está no nosso radar é a questão da Previdência, que ainda é um desafio no Brasil, e a questão do BPC. É um programa que está muito judicializado”, afirmou.
Simone Tebet, ministra do Planejamento, reforçou o compromisso da equipe com o controle das despesas. “Há um dever de casa que o Ministério do Planejamento está fazendo com apoio de todos os ministérios e do presidente Lula para a contenção de gastos, visando à eficiência dos gastos públicos”, disse.
Mudança de postura em relação a 2024
Ao contrário do ano passado, quando o bloqueio orçamentário foi anunciado apenas no terceiro relatório bimestral, o governo decidiu agir já na primeira atualização. A medida é vista como um sinal de maior rigor fiscal diante de um orçamento considerado irrealista por especialistas.
Segundo técnicos, a peça orçamentária aprovada em 2024 continha receitas superestimadas e despesas subestimadas. Do lado da arrecadação, o governo previa cerca de R$ 168 bilhões em receitas extraordinárias, incluindo R$ 28,5 bilhões com julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). No entanto, em 2023, a arrecadação efetiva com essa estratégia foi inferior a R$ 1 bilhão, frente à expectativa de R$ 56 bilhões.
Novas medidas serão anunciadas
Haddad informou que novas medidas pontuais devem ser apresentadas ao presidente Lula nesta quinta-feira (23), mas descartou a existência de um pacote. “Não existe pacote. Existe um conjunto de medidas que são corriqueiras da administração séria que está sendo feita para cumprir o que foi estabelecido com a sociedade”, afirmou.
Segundo o ministro, todos os integrantes do governo concordaram com os ajustes. “Não é surpresa para ninguém. Todo mundo entendeu. Vamos fazer o necessário, como fizemos no ano passado. Vamos continuar nessa batalha, porque entendemos que é o melhor que o Brasil pode ter.”