Ana Paula Veloso Fernandes é apontada como autora de assassinatos em São Paulo e no Rio de Janeiro, com uso de veneno e manipulação psicológica das vítimas
A descoberta do primeiro crime
Na manhã de 11 de abril de 2025, a filha de Maria Aparecida Rodrigues, Thayná, de 24 anos, tentou por horas contato com a mãe, sem sucesso. Às 10h45, já em desespero, pediu que a tia, Maria da Luz, fosse até a residência de Maria Aparecida, no bairro Jardim Flórida, em Guarulhos (SP). A porta estava destrancada. No quarto, Maria da Luz encontrou a irmã morta, seminua, com espuma na boca.
Enquanto aguardava o resgate, uma mulher que se identificou como “Carla” aproximou-se, alegando conhecer a vítima e ter saído com ela na noite anterior, após um encontro por aplicativo. Disse que voltara para buscar roupas de doação e permaneceu no local até a remoção do corpo. No entanto, não compareceu ao velório. Dias depois, a família descobriu que “Carla” era um disfarce usado por Ana Paula Veloso Fernandes, de 36 anos, estudante de Direito, presa sob acusação de envenenar Maria Aparecida e outras três pessoas.
A sequência de assassinatos
O caso de Maria Aparecida foi o segundo de uma série de quatro mortes atribuídas à suspeita entre janeiro e maio de 2025. O primeiro ocorreu em Guarulhos, quando o corpo de Marcelo Hari Fonseca, 51, foi encontrado na casa onde vivia com Ana Paula havia poucos dias. A própria estudante acionou a Polícia Militar, alegando sentir um “mau cheiro”. Vídeos gravados por câmeras corporais mostram a mulher sorrindo diante dos agentes, mesmo após confirmar que o homem estava morto.
Duas semanas após a morte de Maria Aparecida, a polícia identificou um novo crime: o de Neil Corrêa da Silva, 65, em Duque de Caxias (RJ). Ele teria ingerido feijoada contaminada com chumbinho — pesticida altamente tóxico. Por esse homicídio, também foi presa Michelle Paiva da Silva, filha da vítima.
A quarta morte atribuída à estudante é a do tunisiano Hayder Mhazres, 21, que passou mal após tomar um milk-shake durante um encontro com Ana Paula em São Paulo. A suspeita acompanhou a vítima até o hospital e, após o óbito, foi pessoalmente à delegacia comunicar a morte.
Perfil frio e manipulador
Segundo o delegado Halisson Ideiao Leite, do 1º Distrito Policial de Guarulhos, Ana Paula apresenta traços típicos de psicopatia. “É uma pessoa extremamente manipuladora, que tentou controlar a narrativa desde o início, inclusive conosco. Mantivemos a estratégia de deixá-la acreditar que nos influenciava enquanto estudávamos o comportamento dela”, afirmou.
Para o psiquiatra forense Talvane de Moraes, que não analisou diretamente o caso, a postura da suspeita indica plena consciência dos atos. “Acionar as autoridades pode ser uma forma de buscar impunidade e se colocar no papel de vítima”, avaliou.
O delegado classificou Ana Paula como uma serial killer, afirmando no relatório do inquérito que, “em caso de soltura, certamente voltaria a atentar contra a vida de terceiros”. As investigações continuam, e a polícia apura se há outras vítimas.
Manipulação e falsos relacionamentos
Após o assassinato de Marcelo, a suspeita chegou a impedir familiares do homem de entrarem no imóvel, alegando falsamente que havia pago pela estadia. Já no caso de Hayder, o irmão da vítima relatou à Polícia Civil que Ana Paula tentou chantagear a família dizendo estar grávida e chegou a procurar a Embaixada da Tunísia para acompanhar o traslado do corpo. “Ela afirmou que queria se casar mesmo após a morte para garantir seus ‘direitos’ como suposta viúva”, declarou o irmão, Hazem Mhazres, em depoimento.
Execuções por encomenda
As investigações revelaram ainda que Ana Paula e sua irmã gêmea, Roberta Cristina Veloso Fernandes, também presa, cobravam por assassinatos que chamavam de “TCC” — uma referência irônica a “Trabalho de Conclusão de Curso”. Cada execução custava cerca de R$ 4 mil, valor que seria dividido entre as duas.
Em 24 de abril, duas semanas após a morte de Maria Aparecida, Ana Paula viajou ao Rio de Janeiro, onde, segundo a polícia, tentou matar duas pessoas. Um dos ataques não foi consumado; o outro, contra Neil Corrêa da Silva, terminou em mais uma morte atribuída à estudante de Direito.
( Com O GLOBO )