Setor agrícola francês e exigências ambientais seguem como obstáculos no caminho para a implementação do tratado
Após mais de duas décadas de negociações, a União Europeia confirmou a validação do acordo comercial com o Mercosul, bloco que reúne Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. A medida, porém, ainda precisa passar pela ratificação dos parlamentos nacionais e do próprio bloco europeu antes de entrar em vigor. O anúncio foi feito em um momento considerado estratégico, em razão da instabilidade provocada pelas tarifas de 50% impostas pelos Estados Unidos a diversos países, incluindo o Brasil.
Obstáculos internos no bloco europeu
Embora represente um avanço, o tratado enfrenta resistências significativas. O setor agrícola francês, por exemplo, classifica o acordo como “inaceitável”, sob o argumento de que os produtos sul-americanos não seguem os mesmos padrões sanitários e ambientais exigidos na Europa. Para especialistas, essas pressões internas podem prolongar os prazos de ratificação.
Segundo o analista em comércio exterior Jackson Campos, o processo deve envolver “salvaguardas em produtos sensíveis” e ajustes internos no Mercosul para garantir compromissos assumidos. O especialista em relações internacionais Guilherme Frizzera avalia que, embora a aprovação não esteja garantida, a expectativa é de assinatura em dezembro, durante a cúpula do Mercosul em Brasília.
Impactos esperados para o Brasil
Estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) aponta que o tratado pode gerar ao Brasil um crescimento acumulado de 0,46% no PIB entre 2024 e 2040, equivalente a US$ 9,3 bilhões a preços constantes de 2023. Os ganhos brasileiros seriam superiores aos da União Europeia e dos demais países do Mercosul.
“Funciona como um hedge institucional em meio à tensão com os EUA. Amplia acesso a um mercado de alto poder aquisitivo, dá previsibilidade regulatória e sinaliza estabilidade a investidores”, explica Campos. O governo brasileiro considera o acordo estratégico, sobretudo para diversificar parcerias comerciais e modernizar o parque industrial nacional.
Relação Brasil-EUA e busca por novos mercados
Mesmo com saldo positivo na balança comercial de agosto, o primeiro mês do tarifaço norte-americano, o Brasil registrou queda de 18,5% nas exportações para os Estados Unidos. Esse cenário reforça a busca por novos parceiros, com a União Europeia despontando como alternativa.
Frizzera destaca que o tratado pode impulsionar a modernização da economia ao facilitar a entrada de produtos e tecnologias de maior valor agregado, além de atrair investimentos diretos. “A proximidade com a União Europeia permite ao Brasil diversificar mercados, aprofundar o comércio com a Europa e fortalecer sua autonomia na política externa, abrindo acesso a mais de 700 milhões de consumidores”, afirma.
Ainda assim, Campos alerta que o alívio frente às tarifas dos EUA será parcial e gradual. “O acordo melhora previsibilidade e dilui riscos, mas não substitui o mercado americano de um mês para o outro. Será necessário aproveitar cronogramas tarifários e cumprir exigências de sustentabilidade para capturar a demanda europeia”, ressalta.



