Após meses de tensão comercial e tarifas punitivas, presidente dos EUA reabre diálogo com Pequim, visando proteger economia doméstica e evitar escalada nas sanções. Índia e Brasil tornam-se novos alvos de tarifas elevadas.
Reaproximação estratégica após meses de confronto
Depois de tratar a China como inimiga comercial durante grande parte do ano, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, mudou de tom e recolocou Pequim no centro de seus esforços diplomáticos e econômicos. O objetivo é evitar uma nova escalada tarifária que poderia prejudicar o comércio global e a própria economia americana.
Em abril, Trump classificou a China como “a maior ameaça à América” e impôs tarifas de até 145% sobre produtos chineses. Porém, nos últimos meses, prorrogou a suspensão de parte das tarifas, elogiou o presidente Xi Jinping como “um grande líder” e ventilou a possibilidade de uma cúpula bilateral no segundo semestre. Atualmente, as tarifas médias sobre produtos chineses estão limitadas a 30%, enquanto países como Índia e Brasil enfrentam taxas de 50%.
Motivos para aliviar a pressão sobre Pequim
Analistas apontam que a mudança de postura tem razões práticas e estratégicas. Com a aproximação da temporada de compras de fim de ano, varejistas americanos pressionam para garantir o abastecimento de mercadorias chinesas. Além disso, Washington busca tempo para negociar um acordo comercial mais amplo, incluindo setores como tecnologia, energia e minerais de terras raras.
Antonio Fatas, professor de economia na escola de negócios Insead, avalia que a China mostrou maior disposição para sustentar uma guerra comercial total, o que poderia gerar impactos econômicos insuportáveis para o governo Trump.
Terras raras: o trunfo de Pequim
O controle chinês sobre cerca de 60% da produção global e 90% do refino de terras raras — insumos essenciais para a fabricação de veículos elétricos e equipamentos militares — tornou-se um ponto crucial na disputa. Em resposta às tarifas americanas, Pequim impôs restrições à exportação de sete minerais estratégicos e ímãs permanentes, afetando diretamente setores-chave dos EUA.
Paralelamente, Washington endurece as restrições ao acesso chinês a chips avançados de inteligência artificial e pressiona para que Pequim reduza as importações de petróleo russo. Também busca ampliar as compras chinesas de soja americana, visando beneficiar o setor agrícola e reduzir o déficit comercial de US$ 295,5 bilhões registrado em 2024.
Interesses chineses nas negociações
Pequim, por sua vez, reivindica a redução permanente das tarifas sobre tecnologia e manufatura, além de garantias contra sanções e acesso contínuo a chips de ponta produzidos nos EUA. O governo chinês tem desestimulado o uso do processador H20 da Nvidia — o mais avançado autorizado para exportação ao país —, em sinal de que busca reduzir sua dependência tecnológica americana.
Contexto geopolítico e agenda interna
Especialistas apontam que, além do comércio, Trump enfrenta pressões domésticas e desafios internacionais. Entre eles, a reunião marcada para 15 de agosto com o presidente russo, Vladimir Putin, no Alasca, para tratar da guerra na Ucrânia.
Segundo Alicia Garcia-Herrero, economista sênior do think tank Bruegel, com sede em Bruxelas, o cenário obriga Trump a oferecer à China mais flexibilidade do que concede a outros países.
Índia e Brasil viram alvo de tarifas
Enquanto a China ganha fôlego, a Índia e o Brasil passaram a ser alvo de tarifas mais severas. Nova Délhi, que já foi vista como parceira estratégica, agora enfrenta uma tarifa punitiva de até 50%, incluindo sobretaxa sobre petróleo russo, a partir de 27 de agosto.
O Brasil, que no início da guerra tarifária havia sido poupado, passou a ter produtos como café, carne bovina e açúcar taxados em 50%. Entretanto, setores como aviação civil, veículos, suco de laranja e petróleo ficaram de fora dessa alíquota máxima.
Pressão indireta e tarifa de transbordo
Mesmo reduzindo o tom contra a China, Trump mantém mecanismos de pressão. Exportadores chineses têm redirecionado mercadorias via países do sudeste asiático, como Vietnã e Malásia, para driblar tarifas. Em resposta, a Casa Branca impôs uma tarifa de transbordo de 40% sobre nações suspeitas de facilitar esse redirecionamento.
Perspectivas para um acordo
Garcia-Herrero, também economista-chefe para a Ásia-Pacífico no banco de investimento Natixis, prevê que as negociações resultarão em um “degelo parcial”, beneficiando sobretudo empresas americanas. Para ela, é provável que haja avanços nos controles de exportação de chips e minerais, com tarifas básicas menores para a China e maior acesso de empresas dos EUA ao mercado chinês — possivelmente em detrimento de parceiros como União Europeia, Coreia do Sul e Japão.
( Com DW )