Por Laura Calonego*
Um homem do interior chegou em sua casa esbanjando orgulho. Ele fechou a porta da cozinha e se sentou na simples mesa de madeira, que estava posta com dois pratos, dois copos e quatro talheres humildes. O boiadeiro retirou seu chapéu e encarou a sua esposa, cuja fazia o almoço, distraída. Percebendo que o marido havia retornado, ela se exaltou, extremamente confusa.
– Chegou mais cedo, querido?
– Cheguei, meu bem.
– Ué, você não deveria estar indo levar o Jubileu para cruzar com uma das vacas do Seu Eutenor? – a mulher o questionou, parando de mexer o grande panela de arroz para olhá-lo de cima a baixo, desconfiada – Achei que fosse demorar mais.
– Também achei, mas voltei para casa o mais rápido possível para lhe contar as boas novas – ele estava empolgado e isso causava um leve tremor nas pernas da esposa.
– Que novas? O dono daquela fazenda grande perto da estrada finalmente voltou para essas bandas? – a companheira do boiadeiro demonstrou uma certa empolgação na voz.
– O que?! Claro que não! – o marido cuspiu no chão de tanto ódio – Aquele mauricinho vai se ver comigo antes de chegar na cidade novamente.
– Então o que o aflige?
– Eu tenho um garanhão!
O que?
– Você me ouviu muito bem, mulher. Eu. Tenho. Um. Garanhão. Mais pura raça ao que pude ouvir pelas ruas enquanto voltava para casa. Parece que fiz um bom acordo ao comprar o Jubileu daqueles fazendeiros velhos. Os cabras dos bares estavam falando sobre ele enquanto eu voltava para casa. Falaram o quão grandes são os chifres dele e o quão bom de gaia ele é. Deve ser uma gíria nova para se referir à procriação.
– Ah… Bom… Se é isso o que você acha… – a esposa gaguejou, voltando-se para o fogão em que a comida cheirava muito bem.
– Eu não acho, tenho certeza! Vamos fazer muito mais dinheiro com o Jubileu com o Seu Eutenor do que o que fazíamos com aquele velho reprodutor que alugávamos para o…mauricinho.
Enquanto isso, Jubileu, que estava tomando sua água no bebedouro, percebeu que o velho boi Cesar se aproximou para beber um pouco dela.
– Acha que estavam falando de mim, Cesar? – Jubileu perguntou, confuso.
– Já se viu em um espelho d’água, meu camarada? Pois monochifre assim, duvido muito que seja tão bem abençoado.
– E então quem é bom de chifre?
– Isso eu já não sei, mas acho que aquele velho pelado pulando a janela do quarto deles tem algo a ver com a situação.
