Primeiro dia de sessão teve leitura do relatório de Moraes, sustentações orais e rejeição de recursos das defesas
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta quarta-feira (26) o julgamento da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e sete aliados por tentativa de golpe de Estado. O processo apura a existência de uma organização criminosa responsável por ações contra a ordem democrática, que teriam culminado nos ataques de 8 de janeiro de 2023, em Brasília.
O relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, abriu a sessão com a leitura de seu relatório. Em sua fala, destacou que as ações atribuídas aos investigados configuram um plano progressivo e coordenado para abolir o Estado Democrático de Direito. Segundo ele, o grupo atuou de forma sistemática entre julho de 2021 e janeiro de 2023.
“A natureza estável e permanente da organização criminosa é evidente em sua ação progressiva e coordenada, que se iniciou em julho de 2021 e se estendeu até janeiro de 2023. As práticas da organização caracterizaram-se por uma série de atos dolosos ordenados à abolição do Estado Democrático de Direito e à deposição do governo legitimamente eleito”, afirmou Moraes.
Durante a apresentação, o ministro citou elementos reunidos na investigação, como a quebra de sigilo de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e os argumentos das defesas. Ao final da leitura, o advogado Sebastião Coelho, que representa Felipe Martins, interrompeu a sessão com gritos de protesto e foi retirado do plenário. Ele chegou a ser detido, mas foi liberado em seguida.
Sustentação oral da PGR
Responsável pela sustentação oral da acusação, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, utilizou 30 minutos para detalhar os fundamentos da denúncia. Em sua exposição, mencionou a conduta de Bolsonaro na propagação de ataques às urnas eletrônicas, a reunião ministerial de julho de 2022 — na qual se discutiu “uso da força” —, e os eventos subsequentes ao segundo turno das eleições.
Gonet também abordou os acampamentos organizados em frente a quartéis e os atos de 8 de janeiro. Ressaltou que os dados apresentados por Mauro Cid foram corroborados por outras provas e afirmou:
“A documentação encontrada nas ações policiais permite situar a data de 29 de julho de 2021 como aquela em que Jair Bolsonaro deu curso prático ao plano de insurreição.”
Na ocasião, Bolsonaro havia prometido apresentar provas de fraudes no sistema eleitoral e realizou uma live no Palácio do Planalto. “A partir daí, os pronunciamentos públicos progrediram em agressividade aos poderes constituídos”, disse Gonet.
O procurador ainda reconheceu que a resistência de comandantes militares foi decisiva para impedir que o golpe se consumasse.
Defesa nega envolvimento
Após a acusação, os advogados dos oito denunciados tiveram 15 minutos cada para apresentar suas defesas. Celso Vilardi, que representa Bolsonaro, afirmou que nenhuma prova comprometedora foi encontrada contra o ex-presidente.
O advogado do general Braga Netto, José Luís Oliveira Lima, sustentou que a denúncia não individualiza a conduta de seu cliente. Os demais advogados também negaram o envolvimento dos acusados nas ações descritas pela PGR.
Questões preliminares rejeitadas
Na segunda parte da sessão, o relator analisou as chamadas questões preliminares — recursos processuais levantados pelas defesas. Todos foram rejeitados por maioria.
Entre os pedidos descartados, estavam alegações de suspeição do relator e dos ministros Flávio Dino e Cristiano Zanin, questionamentos sobre a competência do STF para julgar o caso e impugnações à legalidade da coleta de provas e à colaboração premiada de Mauro Cid.
O ministro Luiz Fux divergiu parcialmente, ao entender que o caso deveria ser apreciado pelo plenário do STF, e não pela Primeira Turma. No entanto, prevaleceu o voto do relator, mantendo o julgamento no colegiado de cinco ministros.
A ordem de votação seguirá a seguinte sequência: Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, que preside a turma.
O que está sendo julgado
Nesta etapa, os ministros avaliam se a denúncia da PGR possui elementos suficientes para ser recebida, ou seja, se existem indícios mínimos de crime que justifiquem a abertura de uma ação penal. Se a acusação for acolhida, os oito denunciados passarão à condição de réus.
Ao todo, a PGR apresentou cinco denúncias contra 34 pessoas, divididas por núcleos de atuação. O julgamento em curso se refere a apenas uma delas.
Os crimes apontados
A denúncia apresentada pela PGR atribui aos acusados a prática dos seguintes crimes:
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Abolição violenta do Estado Democrático de Direito – Pena de 4 a 8 anos;
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Golpe de Estado – Pena de 4 a 12 anos;
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Organização criminosa – Pena de 3 a 8 anos;
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Dano qualificado ao patrimônio da União – Pena de 6 meses a 3 anos;
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Deterioração de patrimônio tombado – Pena de 1 a 3 anos.
Os acusados
São alvos da denúncia:
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Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
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Alexandre Ramagem, ex-diretor-geral da Abin;
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Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha;
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Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
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Augusto Heleno, ex-ministro do GSI;
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Mauro Cid, ex-ajudante de ordens;
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Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
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Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil.