Efeitos da Covid
Cinco anos após a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarar a pandemia de Covid-19, cientistas vão consolidando uma compreensão mais ampla sobre os impactos duradouros da infecção no organismo.
Estima-se que cerca de 400 milhões de pessoas ao redor do mundo tenham sido diagnosticadas com alguma forma de Covid longa, caracterizada pela persistência de sintomas por pelo menos três meses após a infecção inicial.
Desde o início da disseminação do vírus, foi possível perceber que a doença poderia ser letal, especialmente para indivíduos com doenças preexistentes, como diabetes e problemas cardiovasculares. No entanto, só com anos de estudos foi possível mapear as alterações persistentes que a Covid-19 pode provocar em diferentes órgãos e sistemas do corpo humano.
Essas sequelas podem se manifestar de diversas formas, como fadiga crônica e comprometimentos cognitivos, além de danos aos pulmões, ao coração e ao microbioma intestinal. Algumas dessas alterações são atribuídas ao processo inflamatório desencadeado pelo vírus, que, em certos casos, persiste mesmo após a infecção aguda. Segundo Braden Kuo, neurogastroenterologista do Hospital Geral de Massachusetts, essa inflamação prolongada pode gerar danos generalizados no organismo.
A seguir, apresentamos os principais avanços da ciência sobre os efeitos prolongados da Covid-19 e os mecanismos por trás dessas alterações.
Pulmões
A infecção pelo SARS-CoV-2 pode desencadear inflamação nas vias respiratórias e levar a sequelas como falta de ar persistente e tosse crônica. Em casos mais graves, a doença pode causar pneumonia e provocar a formação de cicatrizes pulmonares, comprometendo a capacidade respiratória. Pesquisas sugerem que mais de 10% dos pacientes hospitalizados por Covid-19 apresentaram algum grau de lesão pulmonar dois anos após a infecção.
Sistema digestivo
A Covid-19 também afeta o trato gastrointestinal, causando sintomas como náusea, vômito e diarreia. Em algumas pessoas, esses efeitos podem se tornar crônicos, com manifestações como refluxo, dor abdominal e alterações no funcionamento intestinal. Estudos recentes indicam que até 10% dos pacientes relatam dor abdominal persistente e 13% continuam a apresentar problemas gastrointestinais um ano após a infecção.
O vírus pode desregular o microbioma intestinal, reduzindo a presença de microrganismos benéficos e favorecendo o crescimento de bactérias prejudiciais. Além disso, a resposta inflamatória pode comprometer o revestimento intestinal, facilitando a passagem de toxinas e partículas de alimentos para a corrente sanguínea e provocando intolerâncias alimentares.
Cérebro
Problemas neurológicos também estão entre as sequelas da Covid-19. Sintomas como confusão mental, dificuldades de memória e lapsos cognitivos podem persistir por meses. Estudos indicam que entre 20% e 30% dos pacientes relataram confusão mental três meses após a infecção inicial. Além disso, a doença pode desencadear ou agravar transtornos psicológicos, como ansiedade e depressão.
Acredita-se que a inflamação persistente afete os neurônios e comprometa a conexão entre as sinapses, interferindo nas funções cognitivas e emocionais. Outra hipótese é que o vírus afete a barreira hematoencefálica, permitindo que fragmentos do patógeno permaneçam no cérebro e provoquem reações inflamatórias prolongadas.
Coração
A infecção pelo SARS-CoV-2 também está associada a um aumento do risco de problemas cardiovasculares, incluindo infarto, AVC e arritmias. Um estudo amplo apontou que a infecção duplica a probabilidade de eventos cardiovasculares graves por até três anos após o diagnóstico.
Esse impacto pode ocorrer devido ao esforço excessivo imposto ao coração durante a fase aguda da doença, especialmente em indivíduos com doenças preexistentes. Além disso, a resposta inflamatória pode comprometer o funcionamento das células que revestem os vasos sanguíneos, favorecendo a formação de coágulos e aumentando o risco de obstrução arterial.
Sistema circulatório
Pacientes com Covid longa também podem apresentar dificuldades circulatórias, resultando em fadiga intensa, falta de ar e sensação de mal-estar após a prática de atividades físicas. Pesquisadores acreditam que a inflamação pode comprometer fibras nervosas que regulam a contratilidade dos vasos sanguíneos, dificultando o retorno do sangue ao coração.
Além disso, estudos indicam que as mitocôndrias, estruturas celulares responsáveis pela produção de energia, podem ser prejudicadas, afetando o desempenho muscular e agravando o cansaço.
A ciência segue investigando os mecanismos que explicam essas sequelas, enquanto médicos e pesquisadores buscam formas mais eficazes de diagnosticar e tratar as complicações pós-Covid. A compreensão desses impactos é essencial para oferecer suporte adequado aos pacientes afetados e desenvolver estratégias de prevenção e tratamento. (The New York Times Company)