Legisladores do Missouri e Mississippi propõem plano para incentivar deportações e fortalecer agenda de Trump
A política anti-imigratória do ex-presidente Donald Trump encontra respaldo em parlamentares republicanos de estados como Missouri e Mississippi, que buscam ampliar as medidas de repressão a imigrantes sem documentos. Propostas legislativas nesses estados sugerem recompensas de até US$ 1.000 para quem denunciar estrangeiros em situação irregular, contribuindo para sua prisão e deportação.
No Mississippi, o projeto do deputado republicano Justin Keen foi barrado em um comitê legislativo nesta semana. Já no Missouri, uma proposta semelhante segue avançando na Câmara, gerando preocupação entre especialistas e ativistas dos direitos humanos. A iniciativa tem sido criticada por incentivar denúncias baseadas em perfis raciais e fomentar a divisão social em meio a um cenário já polarizado.
“Caçadores de recompensa” para imigrantes
No Missouri, o senador republicano David Gregory apresentou o projeto SB72, que prevê a criação de um sistema de recompensas para quem denunciar imigrantes sem documentos. A proposta inclui a acusação formal de “invasão de propriedade por estrangeiro ilegal”, com penas que podem chegar à prisão perpétua caso as autoridades federais de imigração não assumam a custódia e a deportação do indivíduo detido.
Além disso, o projeto sugere a criação de um Programa de Caçadores de Recompensas para Imigrantes Ilegais Certificados, permitindo que indivíduos atuem na captura de imigrantes sem documentos. Segundo Gregory, o programa funcionaria como uma espécie de “ICE estadual”, em referência ao Escritório de Imigração e Alfândega dos EUA (ICE), responsável por prisões e deportações de imigrantes.
A proposta tem gerado debates acalorados no Senado estadual. Gregory, que chegou a ser chamado de “fascista”, rebateu as críticas e alegou que os caçadores de recompensas não teriam autonomia para realizar prisões indiscriminadas, podendo agir apenas mediante mandados judiciais.
Críticas e impacto social
A proposta foi duramente criticada por parlamentares democratas. A senadora Barbara Washington (Kansas City) alertou para o risco de um aumento das denúncias motivadas por racismo, já que o critério para reportar um suposto imigrante irregular poderia se basear na cor da pele ou no sotaque da pessoa.
“Não me digam que isso não vai acontecer, porque já está acontecendo”, afirmou Washington, segundo o jornal Missouri Independent.
O Missouri também discute um segundo projeto anti-imigratório, apresentado pela senadora republicana Jill Carter, que propõe criminalizar o simples fato de estar em situação irregular nos EUA. Pela medida, imigrantes indocumentados poderiam ser multados em até US$ 10.000 e expulsos para um porto de entrada para deportação.
Essas iniciativas refletem uma tendência crescente entre estados governados por republicanos, que buscam alinhar suas políticas locais à agenda de deportação em massa defendida por Trump.
Mississippi tenta, mas fracassa
No Mississippi, o projeto do deputado Justin Keen seguia a mesma lógica da proposta de Missouri, prevendo recompensas financeiras para informantes e a criação de um sistema de caçadores de recompensas.
Keen defendeu sua iniciativa utilizando o discurso amplamente promovido por Trump, associando imigração à criminalidade. Ele citou o caso de Laken Riley, uma estudante da Geórgia morta por um imigrante sem documentos no ano passado. O nome de Riley batiza um projeto de lei que busca facilitar deportações por crimes menores.
“A administração do presidente Trump deixou claro que deportar imigrantes ilegais é uma prioridade, e estamos orgulhosos de fazer a nossa parte aqui no Mississippi para apoiar essa agenda e proteger nossos cidadãos”, declarou Keen.
Apesar do discurso alinhado à retórica anti-imigratória de Trump, a proposta não avançou no legislativo estadual e foi arquivada.
O Mississippi já foi palco de algumas das maiores batidas migratórias durante o primeiro mandato de Trump. Em agosto de 2019, agentes do ICE realizaram uma megaoperação em fábricas de processamento de frango, resultando na prisão de quase 700 imigrantes. De acordo com um relatório do National Migrant Justice Center, essas ações foram emblemáticas da política de imigração racialmente motivada, punitiva e desumana da administração Trump.
Opinião pública e contexto nacional
A resistência a imigrantes sem documentos tem crescido nos EUA, acompanhando o aumento da população de estrangeiros em situação irregular. Entre 2019 e 2023, o número de imigrantes não autorizados cresceu em três milhões, representando um avanço médio de 6% ao ano, segundo dados do Migration Policy Institute (MPI). O país não via um crescimento tão expressivo desde o início dos anos 2000.
No entanto, medidas adotadas pelo governo Biden, como restrições ao asilo, reduziram o número de travessias ilegais na fronteira a níveis não registrados desde 2020.
Ainda assim, as políticas de deportação de Trump encontram apoio popular. Uma pesquisa do New York Times/Ipsos, realizada entre 2 e 10 de janeiro, apontou que 55% dos eleitores apoiam fortemente ou parcialmente os planos de deportação em massa do ex-presidente. Além disso:
- 63% defendem a deportação de todos os imigrantes que entraram ilegalmente nos últimos quatro anos;
- 88% apoiam a deportação de imigrantes sem documentos que possuem antecedentes criminais.
Com esse cenário, ainda não está claro se o projeto avançará no Missouri, mas a proposta reflete o crescente apoio a medidas mais duras contra imigrantes indocumentados, especialmente em estados sob controle republicano.
( Com EL PAÌS )